Ficam no trabalho, quentinhos,
Dê ao leitor a chance de se identificar
para
Hélio Pólvora e Manoel Leal,
grapiúnas que me ensinaram o bê-á-bá do
jornalismo
Ilustrações:
MARK
T. SMITH
(1868. Wilmington,
Delaware / EUA)
Convidado para um bate-papo sobre jornalismo em uma universidade potiguar, senti um toque de insegurança. Tímido para falar em público, lembrei-me do poeta José Carlos Capinam garantindo estar com TPM (segundo ele, “Tensão Pré-Manifestação”), pouco antes da sua fala no I Encontro Natalense de Escritores (ENE). Eu me vi assim. Dias antes, conversei durante horas, em uma mesa de bar, com veteranos consagrados da imprensa tupiniquim - Zuenir Ventura, Ignácio de Loyola Brandão e Villas-Boas Corrêa -, constatando o histórico sensacional das feras. O que eu poderia acrescentar de novo para estudantes encantados com uma profissão que perdeu o rumo? Quais os frutos e apontamentos? Como traduzir sem amargura a essência do mecanismo jornalístico? Pensei em iniciar o depoimento com a revista “Veja” numa das mãos, firme, denunciando a imprensa mercenária e inconsequente que deve ser evitada a qualquer custo. Concluí que pegaria pesado, aniquilando esperanças, mesmo com a crença de que alguns dos jovens presentes eram leitores da polêmica coluna “Lado B”, que assinava no “JH-Primeira Edição”. E se mostrasse as antigas e lendárias “O Cruzeiro” e “Realidade”, provando que já existiu vida inteligente na nossa imprensa? Ou talvez contar casos inesperados acontecidos no exercício da profissão, citar influências, relembrar entrevistas que fiz para a “Folha de S. Paulo”, “O Tempo” (MG), “A Tarde” (BA), “Tribuna do Norte” (RN), jornais de Portugal e Espanha. Por fim, apostei no improviso. E tudo correu bem. Lembro aqui uma ou outra narrativa.
Talvez
seja possível concluir essa trajetória de quatro décadas, inúmeras publicações
e diversos países, dezenas de colunas e crônicas, blogues e redes sociais, como
o transbordamento sincero de uma alma cigana. Entre o lúdico, o lúcido e
estocadas violentas, procurei usar a palavra pela via da cultura, prestando
serviço à divulgação das artes. Fui um paladino, se me permitem a palavra, da
difusão das artes nordestinas. No fundo, creio na iconoclastia, na
contracultura. Não aprecio jornalismo com Lexotan. David Nasser criticou a
construção de Brasília e a inflação que gerou, tornando o presidente Juscelino
Kubitschek seu inimigo, e invadiu os subterrâneos da Maçonaria, até então um
mistério. Um escândalo! É a minha cara! A favor
do cuspir fogo e também da sensatez, tenho o brilhante Paulo Francis como ícone
confesso. O caro jornalista escreveu: “É bom poder ter espaço para resistir aos
avanços da horda”. Ele é tão impecável como H. L. Mencken, J. R. Guzzo,
Guilherme Fiuza ou Olavo de Carvalho. Fiquei contente ao saber que tinha como
filme favorito o mesmo que está no topo da minha lista, o verborrágico “A
Malvada” (1950), de Joseph L. Mankiewicz. Como ele, desconfio dos raciocínios temperamentais,
afinal nenhuma verdade é absoluta. Entretanto, será que os jornalistas de
espírito devem aparentar sobriedade, inteligência ou qualquer outro artifício?
Creio que vale escrever como quem mija, sem freios.
Descortinando as penumbras da desinformação e fornecendo elementos da realidade nua e crua, o jornalismo reproduz um cidadão bem informado, apto a processar sua opinião no meio que está inserido. Eu creio que jamais será um bom jornalista quem não tem o hábito de ler livros (prosa e poesia, ficção e não-ficção). O bom jornalista leu Flaubert, Victor Hugo, Balzac, Dostoievski, Dickens, Tolstoi, Orwell, Guimarães Rosa etc. Integra a sua cultura literária no que escreve. Jamais será um bom jornalista quem não frequenta teatro e museus, quem não ouve música de qualidade ou desconhece obras cinematográficas além do puro entretenimento. A ignorância aparentemente prazerosa mata qualquer talento nato. O jornalismo vai além da manchete e do escândalo. Ele questiona com a voz da coletividade, investiga com os olhos do bem comum, opina balizado na formação intelectual correta, independente e igualitária. Não merece ser o monstro fabricado nos laboratórios de palavras pagas servindo a pilantras. Não merece ser o texto tosco de militantes esquerdistas, que lacram seus poucos neurônios em uma sabotagem egoísta, reacionária e desoladora, sempre em proveito próprio. O jornalismo de bem passa longe das redações onde fraudadores, ditos profissionais de comunicação, fabricam inverdades, retóricas enfermas, planos escusos de perpetuação de um projeto pessoal oportunista.
No jornalismo, é necessário combinar eficientemente clareza e objetividade em uma estrutura com foco narrativo. Não brota jornalismo verdadeiro sem princípios e valores éticos. Não deveria se tornar jornalista quem não tem coragem, quem não combate o bom combate, quem se apega a valores materiais acima de qualquer moral. Não deveria ser jornalista quem se esquiva da polêmica, quem coloca o status acima do bom desempenho do ofício ou aquele que não procura a viabilidade de um povo independente e civilizado. Cultivo o fruto do aprendizado, pois sei que nada sei e tenho muito a aprender, sempre. Na calada da noite e no silêncio do lar, reafirmo um sentimento de amor e compaixão pela profissão que escolhi como ganha-pão. Atravessei dúvidas e dádivas - como a publicação do livro de entrevistas “ArtePalavra – Conversas no Velho Mundo”, em 2003 -, com o jornalismo pulsando dentro de mim: inquieto, incontrolável, verdadeiro. Apesar de tudo, satisfeito e consciente de que esse ofício maltratado tem relação visceral com meu tempo, meu espírito e com quem por ventura acredita numa admirável imprensa sem armadilhas. Afinal, de jornalismo honesto também se vive.
2006 - 2023
VINTE
JORNALISTAS BRASILEIROS NOTÁVEIS
01
ASSIS
CHATEAUBRIAND
(1892 –
1968. Umbuzeiro / São Paulo)
AUGUSTO NUNES
(1949. Taquaritinga / São Paulo)
DAVID NASSER
(1917 – 1980. Jaú / São Paulo)
GLÓRIA MARIA
(1949 – 2023. Vila Isabel / Rio de Janeiro)
GUILHERME FIUZA
(1965. Rio de Janeiro / RJ)
GUSTAVO CORÇÃO
(1896 – 1978. Rio de Janeiro / RJ)
HÉLIO PÓLVORA
(1928 – 2015. Itabuna / Bahia)
J.R. GUZZO
(1943. São Paulo / SP)
JOEL SILVEIRA
(1918 – 2007. Lagarto / Sergipe)
LEDA NAGLE
(1951. Juiz de Fora / Minas Gerais)
MARÍLIA GABRIELA
(1948. Campinas / São Paulo)
MARISA RAJA GABAGLIA
(1942 – 2003. São Paulo / SP)
MATINAS SUZUKI JR.
(1954. Barretos / São Paulo)
OTTO LARA RESENDE
(1922 – 1992. São João del Rei / Minas Gerais)
OTTO MARIA CARPEAUX
(1900 – 1978. Viena / Áustria)
PAULO FRANCIS
(1930 – 1997. Rio de Janeiro / RJ)
SÉRGIO AUGUSTO
(1942. Rio de Janeiro / RJ)
SONIA COUTINHO
(1939 – 2013. Itabuna / Bahia)