dezembro 14, 2011

.............................. COBRA de DUAS CABEÇAS


A Mondrongo, editora do Teatro Popular de Ilhéus conduzida pelo poeta Gustavo Felicíssimo, lança no próximo sábado, dia 17, às 19h, “Cobra de Duas Cabeças”, de Herculano Assis, revelando poesia e prosa inéditas de Sosígenes Costa (1901-1968), considerado um dos maiores poetas baianos de todos os tempos. O lançamento será no Teatro Municipal de Belmonte, cidade natal do poeta. Segundo Jorge de Souza Araújo, a obra “resulta de amorosa pesquisa e justificado penhor, caros à memória de um poeta de excelência, aqui observado como pensador e crítico notabilizado por uma verrina que de tão surpreendente constitui-se mais ainda afeta à literatura baiana e brasileira.”. Sosígenes, que estreou na imprensa por volta de 1928, em Ilhéus, onde foi colaborador do “Diário da Tarde”, no mesmo ano tornou-se membro da Academia dos Rebeldes, com Jorge Amado, entre outros escritores. Na época, trabalhava como professor de instrução primária. Em 1959 publicou “Obra Poética”, pelo qual recebeu o Prêmio Jabuti de Poesia. Entre 1978 e 1979 foram publicadas a segunda edição, revista e aumentada, de “Obra Poética”, e a póstuma “Iararana”. A poesia de Sosígenes Costa vincula-se à segunda geração do Modernismo. Segundo o crítico literário José Paulo Paes, quando ainda andava acesa a campanha dos modernistas contra o soneto em prol da institucionalização do verso livre, entretinha-se o poeta a escrever seus 'Sonetos Pavônicos', todos rigorosamente rimados e metrificados, nos quais são perceptíveis traços parnasianos e, sobretudo, simbolistas, ainda que tais sonetos nada tenham de passadistas, caracterizando-se antes por uma modernidade que se patenteia, como a de Quintana, na exploração criativa das possibilidades expressionais dessa forma fixa, então esclerosada pela prática mecânica e abusiva.. Ainda no dia 17, o site da editora Mondrongo entrará no ar. Anote desde já o endereço: www.mondrongo.com.br

CHUVA DE OURO

As begônias estão chovendo ouro,
suspendidas dos galhos da oiticica.
O chão, de pólen, vai ficando louro
e o bosque inteiro redourado fica.

Dir-se-á que se dilui todo um tesouro.
Nunca a floresta amanheceu tão rica.
As begônias estão chovendo ouro,
penduradas nos galhos da oiticica.

Bando de abelhas através do pólen
zinindo num brilhante fervedouro,
as curvas asas transparentes bolem.

E, enquanto giram num bailado belo,
as begônias estão chovendo ouro.
Formosa apoteose do amarelo!

Sosígenes Costa 
(1928)

dezembro 10, 2011

.................... O LEITOR AGRADECE, RAMIRO AQUINO


Antônio Lopes, Ramiro Aquino e Kleber Torres são referências jornalísticas no sul da Bahia. Eles cumprem com habilidade o papel social do jornalista: dominam o idioma, bem informados, éticos. Não perseguem publicamente seus desafetos, o leitor para eles deve estar em primeiro lugar.

Esta semana, na coluna “Aquino na Squina”, Ramiro publicou nota pertinente, que merece a atenção de leitores e principalmente de jornalistas: “Um movimento em favor da boa notícia é o que estamos propondo à imprensa regional e faremos o possível para dar a nossa contribuição. As más notícias, algumas necessárias, não podem se sobrepor às boas. (...) Notícia boa existe. É só procurar”. Foi uma puxada de orelha, num estilo classudo, como habitual em sua escrita e comportamento. O leitor agradece, mestre Ramiro. 

Eu deixei de ler com constância alguns jornais justamente pelo destaque excessivo de notícias desnecessárias, descartáveis, pingando sangue, em grandes manchetes, assaltos a acidentes automobilísticos. Muitos leitores são seduzidos por tais notícias, mas é preciso atraí-los para um caminho menos selvagem. Nos últimos meses, enviei releases para um desses jornais sobre minha incansável e positiva atuação cultural no Rio Grande do Norte. Nem uma notinha. Não é uma questão de egocentrismo, os feitos qualitativos de um conterrâneo merecem divulgação. 

A imparcialidade jornalística é impossível, e cada um escreve à sua maneira, baseado no que aprendeu e imitou e admirou. Não merece consideração o jornalista que não informa honestamente, sendo apenas a fonte de informações escolhidas com fins partidários ou mercenários. O jornalismo de outros tempos, de vocação ou destino, tornou-se uma carreira com parvas vantagens. Em vez de conhecer e dar a conhecer o mundo, profissionais de imprensa vivem à custa de magros privilégios: convites para jantares, bilhetes de shows, camarotes, bolsa feminina requintada ou um belo vestido em troca de notinhas. Não parece mais ter importância ser bem informado, culto, inteligente. O preferencial é a pilantragem.


Editores/chefes de redação deveriam refletir profundamente sobre a nota de Ramiro. Quem não publica tragédias sensacionalistas, também raramente incentiva a produção positiva dos itabunenses. Gravemente, pratica relações públicas e publicidade, servindo-se do jornal para esses fins e subestimando o olho vivo do leitor. Nota-se como colunistas perderam o fôlego, transformando-se em vitrine de anúncios, sem opinião de caráter pessoal ou destaque para agentes culturais. Não sou puritano, concordo que todos devem ganhar o suado dinheirinho, mas o leitor vem sendo habitualmente desprezado, predominando a passiva ressonância comercial. 

A sábia nota de Ramiro Aquino veio na hora certa, revelando as dificuldades da imprensa de Itabuna (e de outras cidades) para lidar com o admirável mundo novo da comunicação. Ficará na história grapiúna. Pode ter certeza.

dezembro 09, 2011

.................................................. O LIVRO NEGRO


Uma lista preparada pela SS nazista quando dos preparativos da Operação Leão Marinho, que planejava a invasão da Grã-Bretanha em 1940, após a derrota da França pela Alemanha na II Guerra Mundial, ficou conhecida como “Livro Negro”. Esta lista, descoberta após a guerra, continha o nome de centenas de personalidades da vida britânica que deveriam ser presas e executadas pelos integrantes dos Einsatzgruppen, os esquadrões da morte da SS e foi compilada por um oficial nazista, Walter Schellenberg. Muitos dos nomes da lista já tinham morrido quando ela foi elaborada, como por exemplo Sigmund Freud, mostrando um certo desconhecimento da realidade da sociedade britânica. 

Das 20.000 cópias iniciais do livro, apenas duas existem hoje e uma delas se encontra no Imperial War Museum, em Londres. Alguns dos notáveis integrantes da lista: Winston Churchill – por ser um líder anti-nazista; Neville Chamberlain - ex-líder britânico; o dramaturgo George Bernard Shaw - por ridicularizar os nazistas; o ator Noel Coward – por ser homossexual; os escritores H.G. Wells – por ser socialista – e Virginia Woolf – por ser bissexual; Sigmund Freud – por ser judeu; e Robert Baden-Powell - por ser fundador e líder do escotismo (o escotismo era visto pelos nazistas como uma organização de espionagem). Depois da guerra, uma das integrantes do “Livro Negro”, a feminista e escritora Rebecca West, ao tomar conhecimento de sua existência e dos nomes nela contidos, enviou um telegrama ao seu amigo Noel Coward que dizia: “Querido, veja os nomes ao lado de quem deveríamos ter morrido. Melhor companhia, impossível!”.

dezembro 05, 2011

....................................... DEU GULLAR no JABUTI

ferreira gullar
O Prêmio Jabuti funciona como vitrine para o fortalecimento do setor editorial brasileiro. Na sua mais recente edição, a 53ª, em cerimônia realizada em São Paulo e promovida pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), o poeta maranhense FERREIRA GULLAR e o jornalista paranaense Laurentino Gomes receberam as principais condecorações. A obra “Em Alguma Parte Alguma”, de Gullar, sagrou-se como Livro do Ano Ficção, enquanto “1822”, de Laurentino, foi o grande vencedor da categoria Livro do Ano Não Ficção. O autor do Livro do Ano Ficção foi escolhido entre as obras premiadas nas categorias “Romance”, “Contos e Crônicas”, “Poesia”, “Infantil” e “Juvenil”. Durante a cerimônia, os vencedores das 29 categorias que compõem o prêmio, assim como os segundos e terceiros colocados em cada uma delas, também receberam suas estatuetas. 

Laurentino foi o primeiro a falar, e agradeceu aos colegas empenhados na elaboração de narrativas históricas: “É com senso de missão de contribuir para a educação e para a transmissão de conhecimento que recebo esse prêmio. Nesse ambiente de construção de conhecimento, a história é chamada para essa missão. Faço uma homenagem a todos os historiadores brasileiros, que são a fonte em que bebo”, disse. Gullar optou por uma fala breve e repleta de significado: “Não sei se poesia é literatura. Mas a gente faz poesia porque a vida não basta.” 

Além de poeta, Gullar é crítico de arte, biógrafo, tradutor, memorialista, ensaísta e um dos fundadores do neoconcretismo. Autor dos clássicos “Dentro da Noite Veloz” (1975) e “Poema Sujo” (1976), recebeu o prestigiado Prêmio Camões , em 2010, e um primeiro Jabuti em 2007, por “Resmungos”, considerado também o Melhor Livro do Ano Ficção.  Aos 81 anos, merece o Prêmio Nobel. Veja a lista dos principais vencedores:

Livro do Ano Ficção
“EM ALGUMA PARTE ALGUMA”
Autor: FERREIRA GULLAR
(José Olympio)

Livro do Ano Não Ficção
“1822”
Autor: LAURENTINO GOMES
(Nova Fronteira)

Categoria Teoria e Crítica Literária
CÂMARA CASCUDO E MÁRIO DE ANDRADE – CARTAS, 1924-1944”
Organizador: MARCOS ANTONIO DE MORAES
(Editora Global)

Categoria Artes
“OS SATYROS”
Autor: GERMANO PEREIRA
(Editora Imprensa Oficial)

Categoria Tradução
“O LIVRO DE DEDE KORKUT”
Tradutor: MARCO SYRAYAMA DE PINTO
(Editora Globo)

Categoria Ilustração
“O CORVO”
Ilustrador: MANU MALTEZ
(Editora Scipione)

Categoria Infantil
“OBAX”
Autor: ANDRÉ NEVES
(Brinque-Book)

novembro 30, 2011

..................................................... LÍNGUA LUSÓFONA

pedro rosa mendes e antonio nahud
A Prefeitura de Natal (RN) e a União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA) organizaram, pelo segundo ano consecutivo, o Encontro de Escritores de Língua Portuguesa (EELP), em Natal, de 23 a 25 de Novembro. Estiveram presentes 30 escritores de países como Cabo Verde, Macau, Portugal, Timor, Guiné-Bissau, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Brasil. A abertura aconteceu com o rapper e escritor Gabriel O Pensador, que brilhantemente falou sobre o tema “Poesia Escrita para a Música”. Já no encerramento do II EELP, na sexta-feira, dia 25, às 15h, foi a minha vez de traduzir o que penso em se tratando de “Literatura de Viagens”, refletindo sobre crônicas e descrições de viagens de ontem e de hoje, por meio dos livros. A viagem entendida nas mais diversas formas, como itinerário turístico, literário e interior, que contribui para um melhor conhecimento da nossa identidade, da relatividade dos quadros mentais e culturais, logo de um melhor conhecimento do mundo.  Ao meu lado na mesa, os escritores Manuel Rui (Angola), Márcio de Lima Dantas (Brasil), Rui Lourido (Portugal), Luíza Nóbrega (Brasil), Jin Guo Ping (Macau), Wu Zhiliang (Macau), Mário Máximo (Portugal) e Pedro Rosa Mendes (Portugal). O evento aconteceu na Academia Norte-rio-grandense de Letras. Segundo o presidente da Capitania das Artes (órgão de cultura da Prefeitura de Natal), Roberto Lima, Natal teve a oportunidade de conhecer as diversas culturas do universo lusófono. “A diversidade vocabular lusófona é de uma riqueza invulgar e com certeza enriqueceu os nossos intelectuais e estudantes”, disse. A imprensa portuguesa esteve presente, fazendo a cobertura do II EELP, com destaque para a revista Visão, o Jornal de Letras, o Diário de Notícias e o jornal Sol.


novembro 15, 2011

......................................... O FABULOSO DESTINO de HILDA HILST

hilda hilst
O sorriso enigmático de HILDA HILST (1930 - 2004) interrogava e respondia. Um sorriso invulgar que me ocorre tão nítido, tão límpido, tendo como cenário os jardins exuberantes da Casa do Sol, um sítio a 11 quilômetros de Campinas. Eu costumava visitá-la nos finais de semanas dos primeiros anos dos 90. A poeta habitava aquele claustro desde 1966, abrindo mão da intenso convívio social para se dedicar exclusivamente à literatura. Tal mudança foi influenciada pela leitura de Carta a El Greco (1956), do escritor grego Nikos Kazantzakis, que defende a necessidade do isolamento para se aprofundar na complexidade da própria escrita. A enigmática Casa do Sol é uma residência despojada, de inspiração andaluza, com pátio interno central. Rodeando a construção, uma variedade de árvores. Entre elas, uma figueira centenária, a preferida da escritora. 

“Sou poeta”, confessei com pudor no nosso primeiro encontro. “Ser poeta não é fácil”, respondeu HILDA HILST rindo com extravagância. Desde então, nos tornamos íntimos. Enamorado por sua inteligência incomum e comportamento liberal, deixava-me embalar pela sua voz rouca de dicção perfeita lendo Ovídio, Petrarca, John Donne, Shakespeare, Jorge de Lima, Oscar Wilde e, por fim, Henri Michaux. À noite, víamos a telenovela do horário nobre global, acompanhados por um excitante uísque escocês e intermináveis gracejos de saudável loucura. Estive ao seu lado durante a feitura de “Do Desejo” (1992), numa movediça e fugaz satisfação. Nada esgotava o seu arsenal de palavras, num consciente delírio verbal que explodia todas as fronteiras do dizer.

A dramaticidade da Casa do Sol (foto ao lado) se confundia com prospecções filosóficas sobre o tempo, a morte, o amor, Deus. As paredes intensas, rosadas, manchadas e úmidas, respiravam a solidão compartilhada e a grandeza literária, protegendo o fabuloso destino de sua moradora, uma das protagonistas fundamentais da paisagem intelectual brasileira do século 20. Fotografei Hilda dezenas de vezes em sua sozinhez, registrando a anatomia de um corpo idoso, flácido, de rugas em tom acobreado. Onde a formosura da juventude lembrando Ingrid Bergman ou Jeanne Moreau? 

Avançada para a sua época, ela foi musa de artistas, poetas – Vinicius de Moraes se apaixonou por ela – e milionários. Uma mulher encantadora, livre, generosa, lúcida, sarcástica, queixosa, íntegra, culta, melancólica e apaixonada por cães. Embora tenha alcançado ampla notoriedade pessoal, mastigava o estigma de não se considerar popular, ambicionando ser lida, estudada, discutida. Numa estratégia escandalosa, chamou a atenção para a sua obra por meio de suposta adesão ao registro pornográfico. Filha de família rica do interior paulista, confessou-me episódios terríveis de sua trajetória em busca do inefável, passando por contínuos dissabores, afinal a sociedade burguesa exige o meio-termo, o disfarce, marginalizando quem milita contra a hipocrisia.

O deslumbre desconcertante do texto hilstiano mistura gêneros e linguagens. Babélico, refinado, irreverente, polifônico e múltiplo, numa busca literária mística. Resulta numa visão de angústia e, ao mesmo tempo, de êxtase. Com fervoroso amor pela originalidade, registra um intenso trabalho de linguagem e de musicalidade, um imaginário poético no qual questionamentos metafísicos se mesclam com fatos cotidianos. Sou leitor apaixonado de HILDA HILST,  e jamais me esquecerei dos momentos rutilantes que passamos juntos. 

Hildinha, em um dia infeliz, deixou de falar comigo por ciumadas, conspirações, calúnias, coisas tolas de parasitas. Sofri, mas desconfiava que tinha que ser assim, já havia acontecido com outros frequentadores da Casa do Sol. Ao morrer, não me espantei, pois a sua morte estava anunciada há décadas. Essa grande poeta morria a cada instante desde muito antes de conhecê-la. Portanto, apenas saiu do corpo ao encantamento, rumo ao enigma. Mudou-se para Marduk, o planeta reservado aos poetas, como acreditava. Mas o embevecimento diante da sua criação cresce à medida que as novas gerações percebem a transgressão da sua linguagem complexa, tentadora e relevante. Ave, poeta!

hilda e o namorado cássio reis, 
paris, 1957

novembro 13, 2011

..................... A FACA não CORTA o FOGO: HERBERTO HELDER



“a acerba, funda língua portuguesa,
língua-mãe, puta de língua, que fazer dela?
escorchá-la viva, a cabra!
transá-la?
nenhum autor, nunca mais, nada,
se a mão térmica, se a técnica dessa mão,
que violência, que mansuetude!
que é que se apura da língua múltipla:
paixão verbal do mundo, ritmo, sentido?
que se foda a língua, esta ou outra,
porque o errado é sempre o certo disso”



“A Faca Não Corta o Fogo” (2008) vem interromper catorze anos de silêncio, no que diz respeito a publicação, por parte de HERBERTO HELDER, um dos poetas mais originais da poesia portuguesa contemporânea. Poeta discreto, que recusa entrevistas ou prêmios literários, fugindo da fama e chegando a invocar num raro depoimento: “Meu Deus, faz com que eu seja sempre um poeta obscuro”.


 

novembro 12, 2011

............................................ O CASTELO de RILKE

fotografia de rudolph koppitz
Majestosa edificação de grande estatura, cujas dimensões, estética e imponência despertam admiração, à beira do mar Adriático, quase inacessível, o Castelo de Duíno sobrevive ao esquecimento. O príncipe italiano Carlo Alessandro e o seu mordomo argentino José Gustavo são os mais recentes moradores desse monumento artístico e cultural imortalizado nos versos de Rainer Maria Rilke (1875 - 1926), que viveu nele de 1910 a 1912, então propriedade de sua amiga e mecenas, a princesa Marie von Thurn und Táxis.

Deslumbrado com “As Elegias de Duíno” (1912-1923), obra em que o poeta austríaco revela a influência do pensamento filosófico de Sören Kierkegaard, visitei o castelo-personagem nos primeiros anos deste novo milênio. Fabuloso, mesmo sem o açoite de ondas em fúria ou fantasmas de contos góticos. Ao seu lado, as ruínas de outro castelo, tal e qual eu guardava na imaginação. Portanto, há dois castelos em Duíno. Do mais velho se comenta dos cultos lunares ritualizados pelos druídas, fala-se também que teve como hóspede no século 14 o autor de “A Divina Comédia” (1304-1321), Dante Alighieri, considerado o primeiro e maior poeta da língua italiana, definido como “Il sommo poeta” (O poeta supremo).

Situado a uns vinte quilômetros da cidade italiana de Trieste, o Castelo de Duíno tem abriga um museu que conserva a memória dos tempos de glória. De uma antiga torre, notei o caminho que leva da fortaleza a praia de Sistiana, trajeto que percorrido diariamente por Rainer Maria Rilke durante sua longa estadia. Poeta hermético cujos poemas traduzem a angústia de um ser inadaptado, Rilke acumulava às suas circunstâncias vitais o fato de ser homossexual em uma sociedade repressiva. Em Duíno escreveu também os poemas que compõem a obra “A Vida de Maria” (1913), os quais o compositor alemão Paul Hindemith viria a musicar. Trabalhando com os limites sensoriais da existência e da melancolia, a sua poesia traduz o fundamento da busca de ser. 

Para Rilke, a poesia não podia ser senão mística, no sentido em que a existência humana só poderia encontrar a sua salvação através da linguagem poética, aspirando ao plano da totalidade, ou seja, a de uma dizibilidade absoluta e redentora. As Elegias apresentam a morte como uma transformação da vida em uma realidade interior, gerando um todo unificado, uma experiência cósmica. Ainda hoje me lembro do impacto da primeira leitura desses versos: “Pois o belo apenas é o começo do terrível, que só a custo podemos suportar, e se tanto o admiramos é porque ele, impassível, desdenha destruir-nos. Todo o anjo é terrível”.

manuscrito de "elegias de duíno"
Propriedade de família nobre, muito antiga, de origem Bergamasco, os Torre e Tasso, o Castelo de Duíno se aproxima dos mil anos de existência, destacando-se durante séculos com uma intensa  alegoria social, artística e cultural ao receber Marcel Proust, Valéry, Einstein, a atriz Eleonora Duse e outras gigantes das artes. Durante a Primeira Guerra Mundial, bombardeado e arruinado, posteriormente renasceu das cinzas. 

Atualmente, além de receber literárias peregrinações, é também um negócio turístico-empresarial alugado para seminários ou celebrações de casamentos. Os visitantes se encantam com “Rocca Degli Usignoli”, um superficial espetáculo de luzes e sons. Seguramente não é um castelo de contos-de-fadas, mas se tornou imortal por sua história, pelos versos de Rilke e pela visão privilegiada do Adriático.

castelo de duíno

novembro 10, 2011

.............................................. EM LOUVOR da NOIVA DO SOL

newton navarro
Quando me deparei com Natal fui enfeitiçado por uma ternura inexplicável, atordoante, que não me largou mais, num caso de amor à primeira vista. Noutras paragens, sentia uma lírica saudade da essência potiguar. Não conseguia esquecer os efeitos fugazes de luz e movimento, a despreocupação com contornos, a aversão aos tons sombrios e os enquadramentos originais, tudo isso envolto numa aura de alegria de viver. Na Vila de Ponta Negra, onde morei inicialmente, diante daquela imensidão azul do Oceano Atlântico, confirmei a gamação por esta terra. 

Para conhecê-la realmente, passei a andar sem destino pelas ruas do Centro Histórico, Ribeira e Petrópolis, Alecrim e Tirol, descobrindo sobrados de outros tempos, sebos, igrejas, mercados populares, botecos, becos e ruelas. Pouco a pouco montei um quebra-cabeça urbano, concordando com o poeta Bosco Lopes: “As muitas outras cidades que me perdoem, mas Natal é fundamental”. Nesta cidade, meu espírito foi tomado pela tranqüilidade, abençoado pelos braços suaves do mar, as dunas brancas, o moroso rio Potengi ao crepúsculo, os dias ensolarados, os cajueiros frondosos, a gente acolhedora e cativante, as luas incendiadas e o vento permanente. Entre perplexo e alumbrado, conheci poetas e prosadores arrojados, líricos e trágicos. 

A “Noiva do Sol” do folclorista Luís da Câmara Cascudo - o seu totem, ícone incontestável, historiador oficial com mais de cem livros publicados - me seduziu. No entanto, meu guia, meu mestre, foi – e continua sendo – Diógenes da Cunha Lima, um poeta afiado, um amigo constante. Aprendi com o Professor Diógenes que “há em Natal um sentimento de que qualquer coisa de boa está para acontecer”. A sua sabedoria me aproximou da poesia de Ferreira Itajubá, Myriam Coeli e Luís Carlos Guimarães; dos desenhos de Newton Navarro e das cores sóbrias de Dorian Gray Caldas; da prosa de Sanderson Negreiros, Oswaldo Lamartine e Nei Leandro de Castro; do jornalismo de Carlos Peixoto, Cassiano Arruda Câmara, Marcos Aurélio de Sá e Vicente Serejo. 

Entre o rio e o mar, mistérios e sortilégios, piso o mesmo chão de piratas franceses, aventureiros holandeses, enfadonhos lusitanos e militares norte-americanos ávidos por farra e miscigenação. Cidade de tipos pitorescos, de extravagantes, de pavões impressionistas, de liturgia mundana, de um curioso e dinâmico colunismo social (um segmento desvalorizado ou em extinção noutras capitais). Terra de geografia amável; de oiticicas, craibeiras, juazeiros, acácias, paus d`arcos, sucupiras em flor e até um baobá; do Solar Bela Vista, do Forte dos Reis Magos, do Teatro Alberto Maranhão e da Coluna Capitolina Del Pretti; da permanência e vigor de artistas que retratam em seu trabalho sua cidade interior, cenográfica, inventada e verdadeira, única. 

Natal é hoje uma das capitais que mais crescem e se modernizam no Brasil, talvez a menos violenta, com uma população de mais de 800 mil habitantes e uma significativa qualidade de vida. Cidade sem tempestades, clara e serena, aberta e cordial, por vezes provinciana. A “esquina do continente” que recebeu da NASA o título de detentora do ar mais puro e renovável do continente sul-americano. É também um dos quatro pontos mais estratégicos do mundo, ao lado de Gibraltar, Suez e Bósforo. 

Fundada num dia de Natal, em 1599, o nome do município tem origem no latim “natale” e, obviamente, na data de sua fundação. É o meu porto, uma paisagem adotada por seu calor humano, a certeza de bons amigos, o seu sol majestoso e sua gente. Amo Natal. Muito obrigado, bem-amada, pela dádiva deste retorno, pela doçura acolhedora e a amorosa intimidade. As minhas palavras de poeta beijam o seu coração.

novembro 09, 2011

........................................... MELANCOLIA no REINO da BAVIERA

ludwig II
Bizarro, estranho e hipersensível, o rei Ludwig II da Baviera (1845 – 1886) governou entre devaneios de soberania, derivada de um direito divino e das pressões de uma monarquia moderna. Entusiasta da arquitetura, da sua época data o Palácio de Linderhof, o Palácio de Herrenchiemsee - cópia do Palácio de Versalhes - e o Castelo de Neuschwanstein, hoje um dos principais pontos turísticos da Alemanha e inspiração do palácio da “Cinderela” de Walt Disney. Conheço todos eles, são maravilhosos! Erguidos na magnífica paisagem da Alta Baviera, decorados por horizontes delirantes obtidos por meio de destrezas teatrais, com florestas pintadas - impérios de fábulas onde as folhas das árvores são pedras preciosas. 

Como um autocrata de tempos antigos, Ludwig criou montanhas e geleiras cenográficas, além de estepes e desertos. À noite, sob a lua, em um lago artificial iluminado por centenas de velas, deslizavam cisnes negros e barcos sofisticados com rapazes semi-nus, enquanto a orquestra, composta por músicos escolhidos a dedo, embriagava de melodias a alma do louco real. Esse jovem belo ansiava o sonho impossível de um mundo de sagrada formosura. Nascido em Nymphenburg, Alemanha, Ludwig II, príncipe da Baviera e depois rei da Baviera, Duque de Zweibrücken e Conde Palatino do Reno, não se interessava por questões políticas, levando uma existência de reclusão, ao mesmo tempo em que patrocinava espetaculares obras musicais, teatrais e arquitetônicas. Logo que ascendeu ao trono, tornou-se patrono do extraordinário compositor Richard Wagner, chamando-o para morar em sua corte, pagando suas dívidas e lhe dando uma vida confortável, como bem merecia. 

Pressionado pelos ministros e demais políticos para se casar e dar um herdeiro ao trono, noivou a Duquesa Sophie Wittelsbach, mas o compromisso  se desmanchou rapidamente. Os seus diários revelam uma homossexualidade latente e mal resolvida, mesmo passando a maior parte do tempo em companhia masculina, numa intimidade erótica com o fidalgo Alfons Weber, o ator Josef Kains e o estribeiro-mor Richard Horning. Destronado em conseqüência da perturbação mental, de gastos excessivos e de alianças com políticos estrangeiros indesejáveis, terminou seus dias confinado no Castelo de Berger, próximo ao Lago Starnberger, no qual morreu afogado juntamente com o psiquiatra que o acompanhava. Sua morte misteriosa, aos 40 anos, nunca foi explicada. 

O cineasta italiano Luchino Visconti narrou sua história conturbada no deslumbrante “Ludwig – A Paixão de um Rei / Ludwig” (1972), com 247 minutos de duração e Helmut Berger no papel principal.

castelo de neuschwanstein

novembro 08, 2011

................................................................. Das TREVAS


A Peste Negra impregnou o meu imaginário ao assistir “O Sétimo Selo / Det Sjunde Inseglet” (1956), de Ingmar Bergman, e ler “A Peste / La Peste” (1947), de Albert Camus. Perturbado, tive uma série de pesadelos noites seguidas. Somente o Holocausto nazista – a perseguição e extermínio sistemático de cerca de seis milhões de judeus na Segunda Guerra Mundial - me chocaria com tamanha intensidade. 

Essa epidemia matou 75 milhões de pessoas em todo o mundo, um terço da população do século 14. Durante esse período de trevas, a Igreja católica foi questionada, seitas e novas formas de pensamentos prosperaram. As minorias inocentes - leprosos e judeus  - foram perseguidas impiedosamente, queimadas vivas e acusadas de serem a causa da peste. 

Tudo se iniciou nos porões dos navios mercantes, que vinham da China, em 1348, trazendo milhares de ratos esfomeados e contaminados pela bactéria “Pasteurella Pestis”. Eles encontraram nas sujas cidades europeias um ambiente favorável para a sua reprodução - os esgotos corriam a céu aberto e o lixo se acumulava nas ruas. As pulgas dos ratos transmitiram o bacilo da peste nos homens, expandindo a doença com velocidade e resultados desastrosos. 

Após adquirir a bactéria, apareciam nos humanos gânglios azulados de pus e sangue nas axilas, virilhas ou pescoço. Em seguida, vômitos e febre alta. A morte era certa, não havia cura para a peste bubônica (apelidada na época de Peste Negra) e a medicina ainda engatinhava. Para piorar a situação, a Igreja católica se opunha ao desenvolvimento científico e farmacológico. Quem tentava desenvolver remédios era perseguido e condenado à fogueiras como bruxo. 

A doença só foi realmente estudada cientificamente e identificada alguns séculos depois. Relatos mostram que faltavam caixões e espaços nos cemitérios para enterrar os defuntos. Os mais pobres eram jogados em valas comuns, enrolados em trapos, ou abandonados, pela própria família, nas florestas. Suas residências eram saqueadas ou queimadas. Essa epidemia cruzou as fronteiras com facilidade, somente controlada com a adoção de medidas higiênicas nas cidades medievais. Calcula-se que, nas áreas mais afetadas da Europa, mais da metade da população pereceu. 

......................................................... SOBRE o FIM do MUNDO

turner
O homem é um ser enigmático. Obcecado pela vertigem do desconhecido, muitas vezes se deixa levar por profecias que narram o fim do mundo. Escrevo a propósito da especulada profecia Maia.  Essa antiga civilização - cujo império teve seu apogeu entre 250 e 900 d.C. onde hoje é o México e a América Central -, realmente inventou um calendário preciso, complexo e holístico, adivinhando com exatidão vários acontecimentos - como a chegada do homem branco em suas terras, comandado pelo sanguinário espanhol Hernan Cortez, em 8 de Novembro de 1519. Esse mesmo calendário anuncia que algo de muito grave se passará no solstício de inverno de 21 de dezembro de 2012. Tão terrível que o mundo tal como o conhecemos desaparecerá.

Já os profetas medievais garantiram que no século 21 o aquecimento global provocará uma mudança do campo magnético terrestre, levando a um desastre global. Em termos históricos, em todas as civilizações da antiguidade surgiram profecias de um fim próximo. Sempre foi assim e, possivelmente, assim continuará sendo. Muitas dessas profecias trágicas dizem que a humanidade encontrará o seu fenecimento desencadeado por enchentes apocalípticas, chuvas de asteróides de impacto mortal ou fulminada por terremotos, tsunamis, erupções vulcânicas e outros desastres. 

Os cientistas descartam essa paisagem tão drástica, embora um ou outro acredite no drama inevitável que terá origem no derretimento das calotas polares. Portanto, o propagado aquecimento global é fator de destruição gradativa e progressiva do planeta em que vivemos. Basta lembrarmos as ocorrências recentes de desequilíbrio climático em diferentes pontos da Terra. Foram registrados no ano passado, 245 desastres naturais em todo o mundo, causando cerca de 7.000 mortes. Não devemos nos enganar, a administração dos recursos naturais tem se mostrado, de modo geral, a pior possível. O lixo produzido por um modelo de existência consumista e descartável polui os mananciais de água, inclusive os mais profundos. A emissão de gases poluentes é uma realidade em uma sociedade deslumbrada por máquinas movidas a fontes combustíveis. 

A falta de reposição equilibrada do que é velozmente sugado (árvores, água etc.) se transformou em um hábito irresponsável em dimensões inimagináveis, justificando uma comiseração pessimista. Há movimentos ecológicos tentando a redução desse comportamento inconsequente, mas são ínfimas as mudanças significativas. Sendo assim, o fim do mundo é inevitável? Os Maias estavam corretos? Com a palavra, o leitor.

novembro 07, 2011

........................................ O ENIGMÁTICO CONDE ALQUIMISTA

conde saint-germain
O Conde de St. Germain, misterioso aventureiro do século XVIII, renomado e admirado, após a sua morte de data incerta, foi adotado como símbolo religioso por grupos místicos. Segundo os relatos antigos, ele era imortal e alquimista, possuindo o elixir da juventude e a pedra filosofal. “Um homem que sabe tudo e que nunca morre", afirmou Voltaire. De personalidade hipnótica, nunca ninguém o viu comer ou beber publicamente. Jean-Jacques Rousseau declarou ser Saint Germain a mais fascinante e enigmática personalidade que já conhecera. 

A origem de sua  fortuna também é um enigma - ele presenteava pedras preciosas de alto valor sem que ninguém soubesse de onde procediam. Nutria também admiração por culturas orientais, meditava durante horas e ao acordar relatava visitas feitas a terras distantes. Ascético e celibatário, exercia habilidades curativas utilizando ervas medicinais. Sua juventude eterna parecia ser mantida pela alimentação equilibrada e dons misteriosos. Várias testemunhas afirmaram a imagem imutável do Conde, que nunca deixou de aparentar mais de 40 anos. Madame d'Adhemar, biógrafa e dama da corte da rainha Maria Antonieta, conheceu-o em Paris, em 1760, e narra, em suas memórias, que reencontrou-o no velório do Duque de Berri, em 1815, ou seja, 55 anos após, e que incrivelmente ele parecia o mesmo de tantos anos antes, não havia envelhecido. 

St. Germain formou sociedades secretas, ocupou posição proeminente entre os Rosacruzes, os Maçons e os Cavaleiros Templários, escrevendo um único livro, “La Três Sainte Trinosophie” (inédito no Brasil). Hoje em dia, segundo religiosos, é um dos “Chohans dos Sete Raios”, relacionado com a evolução no plano físico cósmico, ou seja, o "Mestre Ascenso do Sétimo Raio", emanando a chama violeta, uma poderosa força espiritual, um fogo sagrado de intenso brilho.

novembro 06, 2011

.............................................. ANOS 60

goya
Os anos 1960 passaram para a história como uma época de inovação e inquietude, influenciando radicalmente mudanças de comportamento. A palavra de ordem era quero que vá tudo pro inferno". Tempo de cabelos longos, roupas coloridas, misticismo oriental, música rebelde e drogas alucinógenas. A moda era não seguir a moda, representando um conceito de liberdade, de sociedade underground, à margem do sistema oficial.  Foi a década da minissaia criada pela estilista inglesa Mary Quant, da pílula anticoncepcional, do sexo livre, de movimentos civis em favor dos negros (Black Power), da homossexualidade (Gay Power) e da libertação feminina (Women`s Lib); da contestada guerra do Vietnã, dos hippies pregando a paz e o amor.

Foi também a década da Revolução Cultural na China, da Primavera de Praga; dos Beatles, de Jimi Hendrix, Janis Joplin e da música de protesto, com Bob Dylan e Joan Baez à frente; do Concorde viajando em velocidade superior à do som, das excursões à Lua; de ícones da beleza natural como as atrizes Jean Seberg, Anouk Aimée e Jane Fonda, ou modelos como Twiggy e Veruschka; de John F. Kennedy, Che Guevara e Martin Luther King; do cinema de Jean-Luc Godard, Glauber Rocha e Michelangelo Antonioni; do impacto da Arte Pop; das idéias e dos livros de Sartre, Simone de Beauvoir, Carlos Castañeda e Hermann Hesse; dos transplantes de coração; da Nouvelle Vague e do Cinema Novo, de “Hair” e do Teatro Arena; do Movimento Tropicália com Tom Zé, Torquato Neto e Os Mutantes; do festival de Woodstock, reunindo cerca de 500 mil pessoas em três dias de música, sexo, LSD e haxixe. 

No Brasil, vivia-se à sombra de um regime militar e de um capitalismo troglodita. A crise se arrastava desde a renúncia do presente Jânio Quadros, em 1961. O vice de Jânio, João Goulart, assumiu a presidência com um populismo de esquerda. Temendo uma guinada do Brasil para o comunismo, foi organizada uma manifestação contrária ao presidente, reunindo uma multidão pelas ruas do centro da cidade de São Paulo, na chamada “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”. Para evitar uma guerra civil, Jango covardemente abandonou o cargo, refugiando-se no Uruguai. 

Os militares tomaram o poder, decretando o Ato Institucional Número 1 (AI-1), cassando mandatos políticos de opositores ao regime vigente. O general Castello Branco, eleito presidente pelo Congresso Nacional, dissolveu os partidos políticos. A partir de 1967, com o general Costa e Silva no poder, a UNE (União Nacional dos Estudantes) organizou, no Rio de Janeiro, a “Passeata dos Cem Mil”; greves de operários paralisaram fábricas; a guerrilha urbana se organizou, assaltando bancos e sequestrando embaixadores para obter fundos para a luta armada. Resultou no Ato Institucional Número 5 (AI-5), aumentando a repressão militar e policial. 

Em 1969, com um novo presidente, outro general, Emílio Garrastazu Medici, uma severa política de censura controlou jornais, revistas, livros, peças de teatro, filmes, músicas e outras formas de expressão artística. Professores, estudantes, políticos e artistas de tendência de esquerda foram investigados, presos ou exilados. Criou-se o SNI (Serviço Nacional de Informações). O DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações e Centro de Operações de Defesa Interna). A polícia dissolvia passeatas com cassetetes e gás lacrimogêneo, recebendo pedradas, bolas de gude (contra a cavalaria da PM) e coquetéis molotov. 

Nas escolas, o clima era de exaltação a pátria. Vendia-se um Brasil maravilhoso. Nos carros, os adesivos diziam: “Brasil - Ame-o ou Deixe-o!”

"Guernica", de Pablo Picasso

novembro 05, 2011

......................................................... HOMENS e LOBISOMENS

“o lobisomem” (1589), de goltzius

O mito do Lobisomem nasceu na Grécia. Diz-se do homem que pode se transformar em lobo - ou em algo semelhante - em noites de lua cheia, voltando à forma humana ao amanhecer. A imagem mais comum é a de uma criatura do mal, percorrendo a noite à caça de vítimas. Essa lenda teve poderoso impacto na Europa do séc. XV, resultando em mais de 30 mil ações judiciais contra supostos lobisomens. O termo correto para definir o lobisomem é licantropo (derivada do rei mítico Licaão), da licantropia, uma doença mental em que vítima  pensa que é um lobo. Tem origem em desejos sexuais reprimidos.

A LENDA

Ao desafiar ou destruir magos influentes, o homem se torna lobisomem. A metamorfose acontece na primeira noite de lua cheia após o encantamento e transformação inicial é traumática. Alguns lobisomens herdam a maldição de pai ou mãe. Outros se tornaram lobisomens pela mordida de um lobisomem. Quando um casal tem sete filhas e o oitavo filho é homem, esse menino está condenado a ser lobisomem. Também tem o mesmo destino o rebento de mulher amancebada com padre.

Todos eles sentem um incontrolável desejo de sangue na época de lua cheia e quase sempre matam suas vítimas. Nessas noites, visitam sete partes da região onde vivem, sete pátios de igrejas e sete encruzilhadas. Por onde passam, apagam as luzes e atacam pessoas, uivando de forma horripilante. Para quebrar o encanto é preciso acertar o bicho com balas de prata ou untadas com cera de vela queimada em três missas de domingos ou missa-do-galo, na meia-noite do Natal.