novembro 29, 2024

.................................. A um BRUXO, com AMOR - SELETA

 

  
“É grande, é imenso, o Machado.
É o pico solitário das nossas letras.
Os demais nem lhe dão pela cintura.”
MONTEIRO LOBATO
(1882 - 1948. Taubaté / São Paulo)
 
Ilustrações:
ÉDOUARD MANET
(1832 – 1883. Paris / França)
 

 
Um dos principais nomes do Realismo brasileiro. Com romances marcados principalmente pela ironia e pelo pessimismo, o “Estilo Machadiano” retrata um Brasil do século 19 que unia, ao mesmo tempo, um sistema escravocrata com as ideias de liberdade. Romancista, contista, cronista, jornalista, poeta e teatrólogo, o carioca MACHADO de ASSIS (1839 – 1908. Rio de Janeiro / RJ) ocupou por mais de dez anos a presidência da Academia Brasileira de Letras (ABL). Nasceu e foi criado no Morro do Livramento. Em 1854, aos 15 anos, publicou o primeiro trabalho literário, o soneto “À Ilma. Sra. D.P.J.A.”, no “Periódico dos Pobres”. Em 1856, conseguiu emprego na Imprensa Nacional como aprendiz de tipógrafo. Em 1860, já escrevendo, trabalhava na redação do “Diário do Rio de Janeiro”. Seu primeiro livro de poesias, “Crisálidas”, saiu em 1864. 
 
rua cosme velho, 18
Filho de um operário e de uma dona de casa, perdeu a mãe muito cedo, pouco se conhecendo de sua infância e adolescência. Negro, gago, epilético e de família humilde, se casou em 1869 com Carolina Augusta Xavier de Novais, sua companheira durante 35 anos. O primeiro romance, “Ressurreição”, saiu em 1872. No ano seguinte, o escritor foi nomeado primeiro oficial da Secretaria de Estado do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, iniciando assim a carreira de burocrata que seria até o fim o meio principal de sobrevivência. Em 1874, publicou em folhetins, o romance “A Mão e a Luva”. Intensificou a colaboração em jornais e revistas, como em “O Cruzeiro” e “A Estação”. Uma de suas peças, “Tu, só Tu, Puro Amor”, foi levada à cena no Imperial Teatro Dom Pedro II, em 1880, nas festas do Real Gabinete Português de Leitura para comemorar o tricentenário de Camões.
 
Do grupo de intelectuais que se reunia na redação da “Revista Brasileira”, e principalmente de Lúcio de Mendonça, partiu a ideia da criação da Academia Brasileira de Letras, projeto que MACHADO de ASSIS apoiou desde o início. No dia 28 de janeiro de 1897, quando se instalou a Academia, foi eleito presidente da instituição, à qual ele se devotou até o fim da vida. Apesar das barreiras, tornou-se um dos maiores escritores brasileiros. Seu nome se insere aos poucos no cânone da literatura mundial. Sua obra abrange vários gêneros literários. Depois do período romântico, entrou numa fase que o tornou reconhecido como um dos maiores autores da literatura de língua portuguesa. Passou os últimos 24 anos de vida em um chalé, número 18, na rua Cosme Velho, na cidade do Rio de Janeiro. Ficava muito tempo em casa, jardinando, lendo e escrevendo. Por isso, ganhou a alcunha de “Bruxo do Cosme Velho”.
 
Em um tributo a MACHADO de ASSIS, listo uma seleta de 33 aforismos e frases de sua escrita elegante.
 

 O ALIENISTA
01
A loucura, objeto dos meus estudos, era até agora uma ilha perdida no oceano da razão; começo a suspeitar que é um continente.
 
 CONTOS FLUMINENSES
02
Infelizmente não há bonito sem senão, nem prazer sem amargura.
 
03
As grandes dores desfiguram, assim como as grandes alegrias.
 
04
Esquecer é uma necessidade. A vida é uma lousa, em que o destino, para escrever um novo caso, precisa apagar o caso escrito.
 
 
DOM CASMURRO
05
Nem tudo é claro na vida ou nos livros.
 
06
A vaidade é um princípio de corrupção.
 
07
O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida, e restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não consegui recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a fisionomia é diferente. Se só me faltassem os outros, vá; um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mas falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo.
 
08
Vida diferente não quer dizer vida pior; é outra coisa. A certos respeitos, aquela vida antiga aparece-me despida de muitos encantos que lhe achei; mas é também exato que perdeu muito espinho que a fez molesta, e, de memória, conservo alguma recordação doce e feiticeira. Em verdade, pouco apareço e menos falo. Distrações raras. O mais do tempo é gasto em hortar, jardinar e ler; como bem e não durmo mal.
 

09
Você já reparou nos olhos dela? São assim de cigana oblíqua e dissimulada.
 
10
A imaginação foi a companheira de toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de empacar, as mais delas capaz de engolir campanhas e campanhas, correndo.
 
11
Não precisa correr tanto; o que tiver de ser seu às mãos lhe há de ir.
 
12
As pessoas valem o que vale a afeição da gente, e é daí que mestre Povo tirou aquele adágio que quem o feio ama bonito lhe parece.
 

ESAÚ e JACÓ
13
Como é que se matam saudades não é coisa que se explique de um modo claro. (…) Há quem creia que, ainda mortas, são doces, mais que doces.
 
14
As ocasiões fazem as revoluções, disse ele, sem intenção de rimar, mas gostou que rimasse, para dar forma fixa à ideia. Depois lembrou a índole branda do povo. O povo mudaria de governo, sem tocar nas pessoas.
 
 HELENA
15
Quando a suspeita germina na alma, o menor incidente assume um aspecto decisivo.
 
16
O medo é um preconceito dos nervos. E um preconceito desfaz-se; basta a simples reflexão.
 

HISTÓRIAS sem DATA
17
A natureza tem rios impetuosos e plácidos ribeiros. Se todos fôssemos rios, não havia ribeiros na espécie humana. É bom que haja uma e outra coisa.
 

 IAIÁ GARCIA
18
Das qualidades necessárias ao jogo de xadrez, duas essenciais: vista pronta e paciência beneditina, qualidades preciosas na vida que também é um xadrez, com seus problemas e partidas, umas ganhas, outras perdidas, outras nulas.
 
19
A arte de viver consiste em tirar o maior bem do maior mal.
 
 A MÃO e a LUVA
20
A dor dele era uma espécie de tosse moral, que aplacava e reaparecia, intensa às vezes, as vezes mais fraca, mas sempre infalível.
 
21
Há criaturas que chegam aos cinquenta anos sem nunca passar dos quinze, tão símplices, tão cegas, tão verdes as compõe a natureza; para essas o crepúsculo é o prolongamento da aurora. Outras não; amadurecem na razão das flores; vêm ao mundo com a ruga da reflexão no espírito, — embora, sem prejuízo do sentimento, que nelas vive e influi, mas não domina. Nestas o coração nasce enfreado; trota largo, vai a passo ou galopa, como coração que é, mas não dispara nunca, não se perde nem perde o cavaleiro.
 
22
Digo-lhe que faz mal, que é melhor, muito melhor contentar-se com a realidade; se ela não é brilhante como os sonhos, tem pelo menos a vantagem de existir.
 

 MEMÓRIAS PÓSTUMAS de BRÁS CUBAS
23
Na vida, o olhar da opinião, o contraste dos interesses, a luta das cobiças obriga a gente a calar os trapos velhos, a disfarçar os rasgões e os remendos, a não estender ao mundo as revelações que faz à consciência; e o melhor da obrigação é quando, à força de embaçar os outros, embaça-se um homem a si mesmo, porque em tal caso poupa-se o vexame, que é uma sensação penosa, e a hipocrisia, que é um vício hediondo.
 
24
Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes.
 

25
Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.
 
26
… o tempo caleja a sensibilidade, e oblitera a memória das coisas.
 
 PÁGINAS RECOLHIDAS
27
A vida é uma Babel; cada um de nós vale por uma nação.
 

 QUINCAS BORBA
28
…a autoridade não pode abusar da lei, sem esbofetear-se a si própria.
 
29
(…) o homem só comemora e ama o que lhe aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas.
 
30
E enquanto uma chora, outra ri; é a lei do mundo, meu rico senhor; é a perfeição universal. Tudo chorando seria monótono, tudo rindo, cansativo; mas uma boa distribuição de lágrimas e polcas, soluços e sarabandas, acaba por trazer à alma do mundo a variedade necessária, e faz-se o equilíbrio da vida.
 
 RESSURREIÇÃO
31
Decidam lá os doutores da Escritura qual destes dois amores é melhor, se o que vem de golpe, se o que invade a passo lento o coração. Eu por mim não sei decidir, ambos são amores, ambos têm suas energias.
 
 DIÁRIO CARIOCA 
(1861)
32
Não é desprezo pelo que é nosso, não é desdém pelo meu país. O país real, esse é bom, revela os melhores instintos; mas o país oficial, esse é caricato e burlesco. A sátira de Swift nas suas engenhosas viagens cabe-nos perfeitamente. No que respeita à política nada temos a invejar ao reino de Lilipute.
 
 GAZETA de NOTÍCIAS 
(1893)
33
É meu velho costume levantar-me cedo e ir ver as belas rosas, frescas murtas, e as borboletas que de todas as partes correm a amar no meu jardim. Tenho particular amor às borboletas. Acho nelas algo das minhas ideias, que vão com igual presteza, senão com a mesma graça.
 

TODA a OBRA de MACHADO de ASSIS
 
ROMANCE
Ressurreição (1872)
A Mão e a Luva (1874)
Helena (1876)
Iaiá Garcia (1878)
Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881)
Quincas Borba (1891)
Dom Casmurro (1899)
Esaú e Jacó (1904)
Memorial de Aires (1908)
 
CONTO
Contos Fluminenses (1870)
Histórias da Meia-noite (1873)
Papéis Avulsos (1882)
Histórias sem Data (1884)
Várias Histórias (1896)
Páginas Recolhidas (1899)
Relíquias da Casa Velha (1906)
Casa Velha (1944) [publicação póstuma]. 
 
CRÔNICA e DIVERSOS
Outras Relíquias, Contos, Crítica, Teatro [publicação póstuma] (1910)
Crítica. [publicação póstuma] (1910)
A Semana. [publicação póstuma] (1914)
Novas Relíquias. [publicação póstuma] (1932)
Crônicas. 4 volumes. [publicação póstuma] (1937)
Crítica Literária. [publicação póstuma] (1937)
 

POESIA
Crisálidas (1864)
Falenas (1870)
Americanas (1875)
Ocidentais (1901)
O Almada (1910)
Poesias Completas (com poemas inéditos) (1901)
Poesias Dispersas (1855 - 1939)
 
TEATRO
Queda que as Mulheres têm para os Tolos (1861)
Desencantos (1861)
Hoje Avental, Amanhã Luva (1861)
O Caminho da Porta (1862)
O Protocolo (1862)
Quase Ministro (1863)
Os Deuses de Casaca (1865)
Tu, só tu, Puro Amor (1881)
 
CORRESPONDÊNCIA
Correspondência [publicação póstuma] (1932)
Correspondência (1937)
Cartas de Machado de Assis e de Euclydes da Cunha (1931)
 

LIVROS e FLORES
Machado de Assis
 
Teus olhos são meus livros.
Que livro há aí melhor,
Em que melhor se leia
A página do amor?
Flores me são teus lábios.
Onde há mais bela flor,
Em que melhor se beba
O bálsamo do amor?
 


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