Pela noite eu vou e a encontro no escuro,
Agarro-a pelas ancas e o cu lhe furo.
do Folclore da Calábria - séc. XIX
Ilustrações:
JAROSŁAW JAŚNIKOWSKI
(1976. Legnica / Polônia)
Desde a Grécia Antiga, o sexo inspira poesia. E POESIA ERÓTICA é um desafio maravilhoso. A sensualidade à flor da palavra é a
sua chave, dinamizando a nossa consciência literária. Entra-se num terreno
surpreendente, e isso se deve ao mistério que envolve Eros. Poemas eróticos
inquietam, pois revelam a face mais secreta e despojada do poeta. São versos
geralmente repletos de vida e volúpia, onde o autor mergulha no mais íntimo ao
mesmo tempo em que se expõe, desbravando o corpo enquanto busca, na fluidez e lubricidade
da linguagem, a própria nudez do seu bel-prazer. Mesmo nos períodos de forte
repressão, como na Idade Média europeia, houve significativa manifestação lírica-erótica falada e escrita. Já a literatura
brasileira atravessou os séculos com raras ousadias eróticas. Os nossos poetas
que se aventuraram a tratar de sexo, quase sempre o fizeram às escondidas,
apelando para pseudônimos. O mineiro Carlos Drummond de Andrade escreveu POEMAS ERÓTICOS nos anos 70, optando
por guardá-los em segredo, confiando a seus herdeiros a tarefa de publicá-los
após sua morte. Assim aconteceu, surgindo em 1992 o livro de puro gozo “O Amor Natural”.
“É raríssimo encontrar um autor que nunca tenha experimentado a
linguagem erótica. A diferença é que a maioria apenas tangencia o tema. Poucos
são os que se tornam notórios pornógrafos”, afirma a pesquisadora Eliane Robert
de Moraes, autora da “Antologia da Poesia Erótica Brasileira” (2015). Quando vemos que o acesso ao erótico ou ao pornô é muito
comum podemos nos perguntar: o que resta à poesia, em termos de abordagem do
erotismo? Depois de vagar pelos recônditos libidinosos de Hilda Hilst e POEMAS ERÓTICOS de diversos brasileiros, dos
primeiros sonetos sacanas do “Boca do Inferno” Gregório de Matos, até os
mais recentes, percebi que
apesar de uma certa banalização do sexo, a produção hoje em dia é diversificada. E aqui proponho o erotismo de 45 poetas. Mostram a liberdade sexual como inspiração. O sexo está nas palavras. O poema é espaço de sedução. A seleção retrata o erotismo lírico através dos tempos. Encontra-se nestes versos o êxtase poético de
autores que, ao mergulharem em sensações, desnudam também o leitor,
que se vê com suas contradições ao pensar na fronteira entre o
erótico e o pornográfico, o sexo e o amor. Boa leitura.
Da BÍBLIA ao BRASIL
01
Os teus seios serão, para mim, como cachos de uvas,
e o perfume da tua boca como o das maçãs.
SALOMÃO
(1010 a. C. – 931 a. C. Jerusalém / Israel)
02
Sinto um fogo sutil correr de veia em veia
por minha carne, ó suave bem-querida,
e no transporte doce que a minha alma enleia
eu sinto asperamente a voz emudecida.
SAFO
(630 a. C. - ? Lesbos / Grécia)
03
Estendida sobre o leito, Dóris, de róseas nádegas,
me fez imortal na sua carne em flor.
FILODEMO
(110 a. C. – 36 a. C. Gádara / Jordânia)
04
Para não veres meu emblema viril,
apartas a vista, como o pudor exige:
sem dúvida porque o que temes olhar,
anseias por recebe-lo em tuas entranhas.
SUETÔNIO
(69 a. C. – 130 D. C. Hipona, Annaba / Argélia)
05
Uni meus lábios aos doces lábios de Antígona
e a carne possuiu a carne. Do resto nada digo:
dele somente a lâmpada foi testemunha.
AUTOMÉDON
(63 a. C. – 14 d. C. Cyzicus / Grécia)
06
Ficou em pé, sem roupa, ali diante dos meus olhos.
Em seu corpo não havia um só defeito.
Que ombros e que braços me foi dado ver, tocar!
OVÍDIO
(43 a. C. – 18 d. C. Sulmona / Itália)
07
A tua pica é tão grande quanto o teu nariz, Papilo,
Tanto que a podes cheirar quando rija.
MARCO VALÉRIO MARCIAL
(38 a. C. – 104 d. C. Calatayud / Espanha)
08
Ah, seus braços, seus olhos que me endoidecem,
ah, seu andar estudado, e os beijos de língua incomparáveis
MARCO ARGENTÁRIO
(27 a. C. – 14 d. C. Betica / Itália)
09
E vós tomai, do não assaz caralho,
O animo pronto; baixai a vossa cona,
Enquanto enfio fundo o meu caralho.
PEDÂNIO DIOSCÓRIDES
(40 d. C. – 90 d. C. Anazarbo / Turquia)
10
A carnadura das nádegas redondas palpitava,
mais ondulosa e mais fluída do que a água.
RUFINO
(Séc. II d.C. Grécia)
11
Louvo a bailarina da Ásia que com seus gestos lascivos
suavemente ondula desde a ponta dos dedos.
PIETRO ARETINO
(1492 - 1556. Arezzo / Itália)
12
Quem te vê, que tentação
De conter dentro da mão
E comprimir-te e apalpar-te.
CLÉMENT MAROT
(1496 - 1544. Cahors / França)
13
Liberto-me ficando teu escravo;
Onde cai minha mão, meu selo gravo.
Nudez total! Todo o prazer provém
De um corpo (como a alma sem corpo) sem
Vestes.
JOHN DONNE
(1572 – 1671. Londres / Inglaterra)
14
A volúpia e os desejos são
O que a alma possui de mais raro.
JEAN de LA FONTAINE
(1621 - 1695. Château-Thierry / França)
15
O cono é fortaleza
O caralho é capitão
Os culhões são bombardeiros
O pentelho é o murrão
GREGÓRIO de MATOS
(1636 - 1696. Salvador / Bahia)
16
Palpava um Barnabita irmã Colette
Por trás do parlatório, em desajeito.
A freirinha queixou-se: Nem se mete
Assim. Melhor seria estar num leito.
JEAN-BAPTISTE ROUSSEAU
(1671 – 1741. Paris / França)
17
O bom mineiro tão robusto
Que em negro buraco, sem susto,
Penetra e fura sem cansaço,
Até acabar-se, ficar lasso,
Louvado seja!
CHRISTOPH MARTIN WIELAND
(1733 – 1813. Achstetten / Alemanha)
18
Gosto de moças, mas muito mais de rapazes:
Satisfaço o rapaz, e ele me serve de moça.
JOHANN WOLFGANG VON GOETHE
(1749 - 1832. Frankfurt am Main / Alemanha)
19
Quanta vergonha... Vai-te... Queres mais?
O que tiveste não te satisfaz?
TOMÁS de IRIARTE
(1750 - 1791. Puerto de la Cruz / Espanha)
20
Que esfregações, gemidos, desbaratos!
Que arremessos a seco, numa enfiada!
GIUSEPPE GIOACHINO BELLI
(1791 - 1863. Roma / Itália)
21
Em templo tão estreito,
Vá com jeito
Teu dedo em sua gana,
E a membrana
Só rompa, do hímen teu,
O himeneu.
THÉOPHILE GAUTIER
(1811 – 1872. Tarbes / França)
22
Sem pejo o homem que eu gosto sabe e confessa as delícias do sexo.
WALT WHITMAN
(1819 - 1892. Nova Iorque / EUA)
23
Encontrarás, sobre dois belos seios pontudos,
Dois grandes medalhões de bronze,
E sob o ventre liso, macio como veludo,
Amorenado como bronze.
CHARLES BAUDELAIRE
(1821 – 1867. Paris / França)
24
E essas nádegas ainda, lua de dois
Quartos, alegre e misteriosa, em que depois
Irei alojar os meus sonhos de poeta.
PAUL VERLAINE
(1844 - 1896. Metz / França)
25
Sobe... – e que volta sensual descreve
Para abranger todo o quadril! – prossegue.
Lambe-lhe o ventre, abraça-lhe a cintura,
Morde-lhe os bicos túmidos dos seios.
CASTRO ALVES
(1847 – 1871. Vila de Nossa Senhora do Rosário
do Porto da Cachoeira / Bahia)
26
Franzida e obscura como um ilhós violeta,
Ela respira, humilde, entre a relva rociada
Inda do amor que desce a branda rampa das
Alvas nádegas até o coração da greta.
ARTHUR RIMBAUD
(1854 – 1891. Charleville-Mézières / França)
27
Em suspiros de gozos infinitos
Disse-me ela, ainda quase em grito:
– Mais abaixo, meu bem! – num frenesi.
OLAVO BILAC
(1865 – 1918. Rio de Janeiro / RJ)
28
“Estou com pressa”, diz. “Eu quero vaselina”.
Gentil, o boticário indaga do cliente
Impaciente
A que uso se destina.
“Eu por mim recomendo sempre a boricada.”
E o cliente, a bufar: “Mas que papagaiada!
Pouco me importa qual, pois é para enrabar!”
GUILLAUME APOLLINAIRE
(1880 – 1918. Roma / Itália)
29
a indecência no cérebro se torna obscena, viciosa,
a putaria no cérebro se torna sifilítica
e a sodomia no cérebro se torna uma missão,
tudo, vício, missão, insanamente mórbido.
D. H. LAWRENCE
(1885 – 1930. Eastwood / Inglaterra)
30
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
FLORBELA ESPANCA
(1894 – 1930. Vila Viçosa / Portugal)
31
Nunca te foram ao cu
Nem nas perninhas, aposto!
Mas um homem como tu,
Lavadinho, todo nu, gosto!
ANTÓNIO BOTTO
(1897 – 1959. Concavada / Portugal)
(1897 – 1959. Concavada / Portugal)
32
Na boca ainda o sabor do outro homem
Ela é forçada a dar-me tesão viva
Com essa boca a rir para mim lasciva
Outro caralho ainda no frio abdómen!
BERTOLT BRECHT
(1898 – 1956. Augsburgo / Alemanha)
(1898 – 1956. Augsburgo / Alemanha)
33
Num impudor de estátua ou de vencida,
coxas abertas, sem defesa... nua
ante a minha vigília, a noite, e a lua,
ela, agora, descansa, adormecida.
JOSÉ RÉGIO
(1901 - 1969. Vila do Conde / Portugal)
34
Ela arreganha dentes largos
De longe. Na mata do cabelo
Se abre toda, chupante
Boca de mina amanteigada
Quente. A puta quente.
CARLOS DRUMMOND de ANDRADE
(1902 – 1987. Itabira / Minas Gerais)
35
sob os coqueiros elegantes, junto ao mar e à lua,
há uma vida contínua de calças e falinhas,
um rumor de meias de seda acariciadas,
e seios femininos a brilhar como dois olhos.
PABLO NERUDA
(1904 – 1973. Parral / Chile)
36
acariciarei e beijarei a nuca e a boca e mostrarei seu traseiro,
pernas erguidas e dobradas para receber,
caralho atormentado na escuridão, atacando,
levantado do buraco até a cabeça pulsante,
corpos entrelaçados nus e trêmulos,
coxas quentes e nádegas enfiadas uma na outra
ALLEN GINSBERG
(1926 – 1997. Nova Jersey / EUA)
37
O moço ajoelhou-se esfuçando-lhe os meios
E uma língua de agulha, de fogo, de molusco
Empapou-se de mel nos refolhos robustos.
Ela gritava um êxtase de gosmas e de lírios
HILDA HILST
(1930 – 2004. Jaú / São Paulo)
38
beija-te
a boca
em flor
e por baixo
com seu esporão
te fende te fode
e se fundem
no gozo
FERREIRA GULLAR
(1930 – 2016. São Luís / Maranhão)
39
Teu mamilo é um pênis,
minha boca vulva
onde escorre o leite
que tu me ejaculas.
ROBERTO PIVA
(1937 – 2010. São Paulo / SP)
40
Dá, minha senhora,
tua rija teta,
teu poeta implora
com a boca seca
a boca boceta
doida de Pandora.
ILDÁSIO TAVARES
(1940 – 2010. Gongogi / Bahia)
41
Por que a poesia não pode ficar de quatro
e se agachar e se esgueirar
para gozar
– carpe diem! –
fora da zona da página?
WALY SALOMÃO
(1943 – 2003. Jequié / Bahia)
42
calma calma
logo mais a gente goza
perto do osso
a carne é mais gostosa
PAULO LEMINSKI
(1944 – 1989. Curitiba / Paraná)
A buceta da minha amada
é um tesouro
é o Tosão de Ouro
é um tesão.
É cabeluda, e cabe, linda,
em minha mão.
BRÁULIO TAVARES
(1950. Campina Grande / Paraíba)
44
Segundo especialistas, a chupeta
depende da atitude do chupado:
se o pau recebe tudo, acomodado,
ou fode a boca feito uma boceta.
GLAUCO MATTOSO
(1951. São Paulo / SP)
45
Acorrentados pelo coito
sussurram desconexos
desenhando fios invisíveis
em peles suadas, campos de dálias.
ANTONIO NAHUD
(1969. Itabuna / Bahia)
FONTE
“O Erotismo” (1987)
de Georges Bataille
“O Erotismo”
(1988)
de Francesco Alberoni
“Erotismo e Poesia: dos Gregos aos Surrealistas” (1990)
seleção de José Paulo Paes
“Antologia da Poesia Erótica Brasileira”
(2015)
de Eliane Robert de Moraes
2 comentários:
As mais belas são de Baudelaire e Rimbaud ...
Faltou Bocage.
VALEUUU Antonio Nahud
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