julho 28, 2013

................................... HENRI MICHAUX – o ABISMO POÉTICO

henri michaux

“Pode estar tranqüilo. Ficou algo limpo em você.
Em uma só vida não pode sujar-se completamente”

(Henri Michaux, Poteaux d’Angle, 1981)

Ilustrações:
HENRI MICHAUX


Pode-se torcer o nariz frente ao HENRI MICHAUX desenhista e pintor, pode-se mesmo ter sérias reservas diante do experimentador de drogas, mas jamais negar o interesse que apresenta sua poética secreta e solitária à procura de um sentido. Poesia complexa e espiritual, busca o conhecimento de si mesmo, a devoração interior. Sua criatividade verbal é um exercício visionário em que as palavras, desligadas de seu uso comum, se empregam para transmitir mais um impulso que um significado, numa imaginação poética fortalecida pela observação da realidade, captando a zona sombria e misteriosa do ser humano. Não há uma filiação literária, sua poética vibra em um universo peculiar indefinido, catarse que revela paragens inóspitas do espírito e do mundo:

“Às vezes, não somente ela, mas eu mesmo, com um corpo fluido e duro que sinto em mim, bem diferente do meu, infinitamente mais móvel, flexível e inatacável, lanço-me também com impetuosidade e sem parar contra portas e paredes. Adoro lançar-me de frente contra o armário de espelho. Bato, bato, bato, arrombo, experimento satisfações sobre-humanas, sem esforço vou além do furor e do ímpeto dos grandes carnívoros e das aves de rapina, sinto um arrebatamento que excede comparações. Mas, depois, pensando bem, muito me surpreende, e cada vez mais, que, depois de tantas arremetidas, não haja no armário de espelho uma fenda e nem mesmo um rangido na madeira”.


Poeta francês de origem belga, HENRI MICHAUX nasceu em Namur, em 24 de maio de 1899, numa família burguesa de juristas e arquitetos. Nunca gostou do seu país, nem de sua gente, nem de sua paisagem. Desde pequeno, sentia a realidade como algo distante e se envergonhava de tudo ao seu redor, e então escrevia. Vivia no mundo como estrangeiro e pensava em se tornar monge. Em 1920 abandonou os estudos de medicina para uma longa odisseia como marinheiro, saindo de Boulogne-sur-Mer. Nesse mesmo ano, em Roterdã, repete a experiência rumo a Buenos Aires e Rio de Janeiro. Aos 23 anos, descobre a literatura com o sobressalto que lhe provoca a leitura de “Os Cantos de Maldoror / Les Chants de Maldoror” (1868), do uruguaio Lautréamont (1846-1870). Sua criação literária teria toques da misteriosa, subterrânea e simbolicamente obscura obra de Lautréamont.


De volta a Paris, em 1923, HENRI MICHAUX estuda literatura e depois volta a viajar até 1937 pela Ásia, África do Norte e América do Sul, revelando uma tomada de consciência em relação ao mundo e às coisas. A razão principal pela qual viaja é para expulsar do seu interior “a sua pátria, os seus vínculos de qualquer classe”. Fugindo sempre, das terras estrangeiras enviava poemas que definiu num dos seus livros como “cápsulas de enxergar”. “Segundo dizem, na maioria das pessoas que olha uma paisagem se forma uma cápsula que é a mediunidade entre a paisagem e o contemplador”, escreveu. Seu primeiro livro, “Qui je Fus” (1927), revelou-o como escritor original. Logo publicou o autobiográfico “Ecuador” (1929), um relato de viagem, e “Une Barbare em Asie” (1933), traduzido para o espanhol por Jorge-Luis Borges, que conheceu Michaux e considerou o texto “um jogo”. A seguir veio “Voyage en Grande Garabagne” (1936), “Plume” (1938) e “Lointain Intérieur” (1938). Visitando Montevidéu, Uruguai, em 1936, se apaixonou pela poeta Susana Soca, que morreu jovem e era conhecida pela legendária beleza. Anos depois, em 1943, casaria-se com uma mulher divorciada e tuberculosa, Marie-Louise Termet.


Ele odiava as artes plásticas, mas em 1924 fixa residência em Paris e ao conhecer a obra de Paul Klee, De Chirico, Max Jacob e outros surrealistas, muda de opinião. Fascinado principalmente pela criação do suíço Klee, decidiu buscar um meio de expressão visual. Em 1937, começou a desenhar e a pintar, expondo em galerias e seguindo a mesma ideia da sua literatura: uma viagem através dele mesmo. Sua técnica rápida e leve prefere a aquarela e a tempera ao óleo, fundindo com formas gráficas que lhe permitem criar um universo poético próprio. Não se pode definir seu trabalho pictórico como ilustração, riscos, ideogramas ou alfabeto, é inacabado e inacessível como a sua literatura, outra forma de explorar o mundo interior. Há uma espécie de tremor que habita suas manchas, um despojamento, fragilidade e sobriedade. São como curtos-circuitos, manchas de colorido intenso, caligrafia nervosa que avança e retrocede, impulsos que buscam inutilmente uma saída. “Eu queria desenhar a consciência de existir e o fluir do tempo”, confessou.

michaux fotografado por claude cahun
HENRI MICHAUX foi colaborador assíduo da importante “Sur”, revista literária argentina que difundiu a arte inovadora, além de divulgar as atividades da Resistência Francesa. Tornou-se conhecido em França a partir dos anos 40, quando André Gide escreveu um texto sobre ele. Com a trágica morte de sua esposa, falecida em consequência das graves queimaduras de um incêndio acidental em 1948, escreve em sete páginas o emocionante poema “Noux Deux, Encore”, depois recolhido pelo próprio autor e transformado numa obra clandestina, maldita. Entediado, levando o seu cotidiano para qualquer viagem, interrogou-se em “Passages” (1937-1950): “Para que viajar quando uma rima faz nivelar uma montanha, quando um adjetivo povoa um país, quando uma assonância faz oscilar a Terra inteira?”.


Descobriu os alucinógenos em 1956, e sob controle médico prova ópio, ácido e mescalina, o principal alcaloide do peyote, produzindo através deles várias obras pictóricas e textos experimentais, vibrantes e minuciosos: “L’Infini Turbulent” (1957), “Paix dans les Brisementes” (1959), “Connaissance par les Gouffres” (1961) e “Les Grandes Épreuves de l’Esprit” (1969), “Misérable Miracle” (1972). Como Baudelaire, Quincey, Artaud, Cocteau, Huxley, Castañeda, Burroughs e tantos outros, buscou nas drogas a sensibilidade fora dos limites da mente humana, descrevendo minuciosamente suas sensações, pensamentos e os movimentos que sentiu com suas experiências. Carlos Castañeda foi quem celebrizou o famoso cactos quando contou suas experiências com Don Juan, que dizia que a mescalina ensinava a “maneira mais correta de viver”. Artaud acreditava que com o peyote sabe-se até “aonde chegará o seu ser e até onde ainda não conseguiu chegar”. A droga na obra destes autores desvenda o real invisível como o verdadeiro real. Pelo peyote, os índios huichol se libertavam dos seus pensamentos, dos seus atos (bons ou maus), desnudando-se de todo o seu eu para alcançar a pura liberdade do pensar. Logo que achou que concluiu suas experiências, MICHAUX deixou as drogas por achar que “não estava feito para a dependência”.


A literatura híbrida de HENRI MICHAUX é entrega, êxtase, estertor interior. Diz simplesmente que a vida está onde nós queremos, assim como no erro e na dúvida de cada entrega. Um jogo permanente entre a presença e a ausência, a ascensão e a queda, o circunstancial e o eu. Clássico das vanguardas, sua obra é uma das mais originais do século XX. Esse estranho poeta dizia que a poesia não é o verso, que está em toda a parte, e que o poema matava a poesia. Sem pertencer a qualquer escola literária, seus inesperados textos usaram o simbolismo, o dadaísmo, o surrealismo, o existencialismo, o absurdo e fantasias irônicas e oníricas. Nem todos os lugares e povos que retratava em seus livros são reais, muitos surgiram da sua imaginação com a precisão de um antropólogo, como os seres de “Au Pays de la Magie” (1941). Nele narra os costumes, os rituais e festas, o que pensam e como vivem os magos, os omobules, os ecoravetias, os nonais, os oliabares, os hivinizkis, os hacs, os emanglones e os meidosems, só para citar uns poucos. Com um certo humor negro, o poeta satiriza à maneira de Jonathan Swift a realidade da sociedade em que viveu. Uma veia fantástica muito poderosa, concentrando universos inteiros em pequenos fragmentos, imitando a realidade a partir de um mundo paralelo.


Reservado, esquivo, discreto, tranquilo e elegante, com vida social nula e poucos conhecidos, o poeta não dava entrevista nem permitia ser fotografado, e sua biografia, sem muitos dados concretos, só pôde ser feita através de extratos de sua correspondência privada. Nunca se considerou um literato e recusou receber o Grande Prêmio Nacional de Letras, em 1965. Acreditava que a maioria das pessoas representa um papel, e geralmente ele conseguia muito rapidamente arrancar essa máscara, provocando um desinteresse por elas. Franzino, de saúde frágil, naturalizou-se francês em 1955, e foi um homem sem limites geográficos, mentais ou linguísticos. Um extraordinário caso de um escritor indefinido. A literatura de HENRI MICHAUX combina narração, prosa, descrição etnológica, poesia nada lírica e um certo humor surreal. Seus textos são resultados de anotações, diários, cadernos, notas de viagem, redação de explorações, de descobrimentos, em que introduz sua impressão pessoal, muitas vezes abstrata e simbólica. Um explorador de uma nova visão do mundo e dos seus seres. Morreu em Paris em 1984, sempre apoiado num certo desespero.

PRINCIPAIS OBRAS de MICHAUX

Qui je Fus (1927)

Ecuador (1929)

Une Barbare en Asie (1933)

Voyage en Grande Carabagne (1936)

Plume / Lointain Intérieur (1938)

Au Pays de la Magie (1941)

Arbres des Tropiques (1942)

L’Éspace du Dedans – Pages Choisies (1944)

Épreuves, Exorcismes (1940-1944)

Ailleurs (1948)

Noux Deux, Encore (1948)

La Vie dans les Plis (1949)

Passages (1937-1950)

Mouvements (1951)

Face aux Verrous (1954)

L’Infinit Turbulent (1957)

Paix dans les Brisements (1959)

Connaissance par les Gouffres (1961)

Vents et Poussières (1962)

Les Grandes Épreuves de l’Esprit et les Innombrables Petites (1969)

Façons d’Endormi, Façons d’Éveillé (1969)

Misérable Miracle (1972)

Émergences, Résurgences (1972)

Moments,Traversées du Temps (1973)

Face à ce qui se Dérobe (1976)

Choix de Poèmes (1976)

Poteaux d’Angle (1981)

Chemins Cherchés, Chemins Perdus, Transgressions (1982)


EU REMO

Henri Michaux

Eu maldisse tua fronte teu ventre tua vida
 Eu maldisse as ruas que teu andar desfia
Os objetos que tua mão segura
Eu maldisse o interior dos teus sonhos
Pus uma poça no teu olho que não vê mais
Um inseto em teu ouvido que não ouve mais
Uma esponja em teu cérebro que não entende mais
Eu te esfriei na alma do teu corpo
Eu te gelei na tua vida profunda
O ar que tu respiras te sufoca
O ar que tu respiras tem um ar de adega
É um ar que já foi antes expirado
que já foi rejeitado por hienas
O esterco desse ar já ninguém pode respirar
Tua pele está toda úmida
Tua pele sua a água do grande medo
Tuas axilas desprendem longe um cheiro de cripta
Os animais estacam à tua passagem
Os cães, à noite, uivam, cabeça erguida para a tua casa
Tu não podes fugir
Não te vem uma força de formiga na ponta do pé
Tua fadiga é um touro de chumbo no teu corpo
Tua fadiga é uma longa caravana
Tua fadiga vai até o país de Nan
Tua fadiga é inexprimível
Tua boca te morde
Tuas unhas te arranham
Não mais é tua a tua mulher
Não mais é teu o teu irmão
A planta de seu pé é mordida por serpente furiosa
Babaram sobre tua progenitura
Babaram sobre o riso da tua filhinha
Passaram a babar diante da face da tua moradia
O mundo afasta-se de ti
Eu remo
Eu remo
Eu remo contra a tua vida
Eu remo
Eu me multiplico em remadores inumeráveis
Para remar mais fortemente contra ti
Descambas para o vago
Estás sem fôlego
Tu te cansas antes mesmo do menor esforço
Eu remo
Eu remo
Eu remo
Tu te vais, ébrio, amarrado o rabo de um jumento
A embriaguez como imenso guarda-sol
a escurecer o céu
E a reunir as moscas
A embriaguez vertiginosa dos canais semicirculares
Começo mal ouvido da hemiplegia
A embriaguez não mais te deixa
Te deita à esquerda
Te deita à direita
Te deita no chão pedrento do caminho
Eu remo
Eu remo
Eu remo contra teus dias
Na moradia do sofrer tu entras
Eu remo
Eu remo
Numa fita preta as tuas ações se inscrevem
No grande olho branco de um cavalo caolho
rola o teu futuro
Eu remo

(Tradução de Mário Lanranjeira)

henri michaux

BIBLIOGRAFIA

En Otros Lugares, tradução de Julia Escobar, Madrid, Alianza Editorial, 1983;

Um Bárbaro en Asia, tradução de Jorge Luis Borges, Barcelona, Tusquets, 1984;

Las Grandes Pruebas del Espíritu, tradução de Francesc Parcerisas, Barcelona, Tusquets, 1985;

La Escritura del Rostro, de José Antonio Millán (El País, 20 de fevereiro de 1992);

Poetas de França Hoje / 1945-1995, de Mário Laranjeira, São Paulo, Edusp, 1996;

Henri Michaux, en el Abismo, de J. A. R. (El País, Babélia, 18 de abril de 1998);

Magazine Littéraire nº 364, Abril de 1998;

Mágicos Poderes, de J.H. B. (Expresso, Cartaz, 13 de março de 1999);

Geografia Insurrecta, de Antonio Cabrita (Expresso, cartaz, 13 de março de 1999);

Los Mundos de la Grafía Viajera de Michaux, de Adolfo García Ortega (El País, Babélia, 25 de março de 2000);

Plume – Bulletin de la Société des Lecteurs d’Henri Michaux;

julho 12, 2013

..... ANTONIO NAHUD entrevista JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO



POETA ALAGOANO LANÇA VERSOS AUTOBIOGRÁFICOS
Jornal de Hoje (RN) - 02 de julho de 2013

Ilustrações:
ANDY GOLDSWORTHY


A Escrituras Editora, de São Paulo, publicou, recentemente, “Pedra Só”, o novo livro do poeta alagoano da Bahia José Inácio Vieira de Melo, que foi lançado ontem na capital potiguar em noite concorrida na Academia Norte-rio-grandense de Letras (ANL), junto ao “Livro das Revelações – Matizes do Afeto – O Pensamento Vivo de Escritores”, trabalho coordenado pelo escritor Diogenes da Cunha Lima.

Sexto livro do poeta, o seu trabalho mais autobiográfico, tem um primoroso projeto gráfico e conta com imagens do fotógrafo mineiro Ricardo Prado e texto das orelhas do poeta Vitor Nascimento Sá, no qual alerta o leitor: “A poesia de José Inácio Vieira de Melo não se estabelece no convencimento racional nem nas prerrogativas de cunho moral, mas na percepção do maravilhoso que é produzido como êxtase e fulguração, descoberta e alumbramento”.

Confira  a entrevista!


Quanto de sua poética se baseia na sua experiência pessoal?

Toda a minha poética se baseia na minha experiência pessoal. O delírio sou eu que sinto. Passar cinco anos contemplando uma xilogravura de Abraão Batista para fazer um poema, fez daquele quadro, em que figuravam dois galos de briga, um labirinto onde todas as batalhas inimagináveis foram travadas – e ainda assim eles teceram muitas manhãs.

Como começou a escrever?

Escrevi meus primeiros versos aos 12 anos. Muito inspirado nos poemas de Castro Alves, nos folhetos de cordel e nas músicas dos compositores nordestinos que surgiram na década de 1970, como o Zé Ramalho, o Alceu Valença e o Raimundo Fagner.

Os poetas de hoje parecem preferir o verso livre. Acha que isso é sinal de aversão à disciplina?

Há um descaso enorme por parte dos poetas mais jovens em relação ao conhecimento da poesia e das técnicas da arte poética. Muitos dos versejadores que aí estão não leem poesia e não estão interessados nem um pouco em ter uma base para construir uma obra. Escrevem linhas irregulares e acreditam que estão praticando o verso livre... Mera ilusão! O verso livre é o que requer mais apuração na sua tessitura para conseguir manter o ritmo – o traço espontâneo expressando imagens e sentidos dentro de uma tensão que pode se desdobrar em outros andamentos ou que pode estabelecer uma constância sonora ou ainda um pulsar de ondas.

Poderia falar um pouco sobre a gênese de um poema? O que vem primeiro?

O poema não escolhe hora nem um jeito certo para nascer. Quando menos se espera, vem aquela ideia borbulhando no pensamento, aquela imagem formigando na alma, e aí é pegar ou largar! A poesia é exigente. Não faço poesia quando quero, a Poesia é que determina o momento da sua gênese. Sou um servo da Poesia.

Começa seus poemas pelo começo?

Nem sempre.

O que é mais importante para um poeta: a experiência, a observação, a imaginação ou a inspiração, caso acredite nela?

Tudo é importante para um poeta. Principalmente as coisas sem importância, como diria o poeta Manoel de Barros. E eu acredito na inspiração da mesma maneira que acredito na lapidação e na depilação.

Muitos poetas costumam trabalhar de madrugada, têm manias e são indisciplinados. É o seu caso?

Sim, é o meu caso. A madrugada, senhora do silêncio, é o meu templo e o meu laboratório. Sinto-me indisciplinado porque faço muitas coisas ao mesmo tempo. Por conta disso, há momentos em que tudo vira uma enorme bagunça. Como já disse, o poema aparece quando bem quer. Então, já tive que gravar versos enquanto dirigia, já perdi conta de gado, quando estava em mais de 350 reses, porque um deus desocupado soprou um verso em meu ouvido, ao meio dia em ponto, com o sol a pino, dentro de um curral da Pedra Só. Apesar da imprevisibilidade da Poesia, tenho a mania de escrever meus poemas em agendas, com caneta de tinta preta, deitado numa rede. Mas só consigo ter uma primeira impressão do poema como um todo, depois que o passo para o computador e imprimo uma cópia. O que não quer dizer que esteja realizado. Há poemas que levam meses e/ou até mesmo anos para ficarem prontos.

A técnica é fundamental? Que técnica utiliza para alcançar seu padrão poético?

JÉ fundamental conhecer a técnica ao ponto de usá-la sem nem perceber que o está fazendo, da mesma maneira como usamos as letras para escrever as palavras sem pensarmos em letras formando palavras. Quando faço meus poemas não me preocupo com técnicas, embora estude muito e ainda continue buscando conhecer, cada vez mais, o aparato teórico da arte poética.

josé inácio por ricardo prado

Existe algum poeta que tenha lido e nele reconheceu um parentesco de espírito?

São vários. De imediato, vem-me ao sentindo Jorge de Lima, Gerardo Mello Mourão, Cecília Meireles, Francisco Carvalho, João Cabral de Melo Neto, Lêdo Ivo, João Guimarães Rosa. Sinto que sou da mesma família poética desses mestres encantados.

Tem em mente algum público em especial quando escreve certos poemas?

Não. Faço meus poemas por pura necessidade. É algo imperativo.

Qual dos seus livros tem mais orgulho?

Não diria orgulho, mas o livro que sempre desperta um xodó maior é o mais recente, o que foi publicado por último. Neste momento é o “Pedra Só”.

Existem diferenças essenciais entre a poesia escrita por nordestinos e aquela escrita pelos poetas de outras regiões do Brasil?

Gosto bem mais da poesia feita no Nordeste. A diferença essencial é a qualidade.


A poesia contém música?

A poesia é a música das palavras.

Poderia fazer algum comentário sobre o futuro da poesia?

Enquanto houver sentimento haverá Poesia.

Quais foram as origens de “Pedra Só”?

Poemas esparsos guardados em um arquivo. Até aparecer o poema “Pedra Só” e definir o rumo do livro, tornando-se seu núcleo.

Que emoção este seu mais recente livro desperta em você?

A emoção que um pai tem ao olhar para seu filho amado.

As duas palavras relacionadas no título foram reunidas com algum propósito simbólico? Seria um tipo de contraponto estético, ou é mero acaso?

“Pedra Só” é o nome da minha roça – uma fazenda que fica no sudoeste da Bahia, no fim da caatinga e no início da Chapada Diamantina. Um lugar árido que representa todos os sertões por onde vivi e que é, ao mesmo tempo, um entrelugar que inventei, para onde posso ir e me visitar, no tempo e pelos tempos.

Há quanto vive na Bahia e o que ela representa para a sua literatura?

Moro na Bahia há 25 anos. “A Bahia já me deu régua e compasso”.

Que tipo de trabalho faz para ganhar “algum dinheiro”?

Sou pastor de nuvens e de vacas. Trocando em miúdos: sou promotor cultural (coordeno eventos literários, faço oficinas, palestras e performances) e crio gado.

Você lê os seus contemporâneos? Quais deles recomendaria?

JIVM – Poesia contemporânea é o que mais leio. Roberval Pereyr, Mariana Ianelli, Salgado Maranhão, Sidney Wanderley e Iacyr Anderson Freitas são alguns dos poetas que recomendo. Na prosa, vai a indicação do Ronaldo Correia de Brito, Carlos Herculano Lopes, Tércia Montenegro, Lima Trindade e Dênisson Padilha Filho.


A atual deterioração da língua, essa imprecisão de pensamento e assim por diante, o assusta – ou apenas vivemos uma fase de decadência?

Tudo me assusta muito. E ainda mais esse Nada em que estamos a nos afogar. Desejo mesmo que seja apenas uma fase, mas paira uma sensação de que as coisas só vão piorar: o instinto cada vez mais prevalece sobre o pensamento.

Se importaria em comentar algo sobre “O Livro das Revelações”?

Além de agradecer pelo convite para fazer parte deste relevante trabalho do escritor Diogenes da Cunha Lima, quero dizer que estou com muita vontade de ler o livro e conhecer as peculiaridades de cada um dos artistas da palavra que integram “O Livro das Revelações”.

Será sua primeira visita ao Rio Grande do Norte. Tem alguma expectativa? Conhece algum poeta dessas bandas?

Na verdade, é segunda vez que irei a Natal. Estive, em 2005, a convite de Carlos Newton Júnior, numa passagem bem rápida. Não gosto de criar expectativas, mas sinto que vivenciarei bons momentos e que conhecerei pessoas valorosas, como a minha amiga virtual Angela Felipe, talentosa artista plástica potiguar. Sim, conheço bons poetas da cidade de Natal: Marize Castro, Carlos Gurgel, Iracema Macedo e Antonio Nahud, baiano do Rio Grande do Norte.