dezembro 08, 2017

.................... MOMENTO INESQUECÍVEL: CIDADÃO NATALENSE



O lucro da nossa experiência é tornarmo-nos melhores e mais sábios.
MICHEL de MONTAIGNE
(Saint-Michel-de-Montaigne, França. 1533 – 1592)

Fotografias:
MORVAN FRANÇA


A felicidade está em desfrutar. Sem fugir do presente, costumo recordar os tempos bons. Guardo em algum lugar as alegrias de uma vida aventureira. Em 2013, graças à atividade de escritor e jornalista, fui agraciado com o TÍTULO de CIDADÃO NATALENSE. A sessão solene ocorreu no plenário Érico Hackradt, na Câmara Municipal de Natal. O companheiro e fotógrafo mineiro Morvan França registrou o evento.

Proposto pelo vereador Heráclito Noé (PR), o título foi aprovado por unanimidade. Segundo o político, “pela obra cultural que realizou na capital potiguar, entre os anos de 2003 e 2012, divulgando nossa cidade e seus artistas mundo afora, Nahud é merecedor da homenagem”.

Baiano, adotei Natal para viver, depois de morar em diversas cidades no Brasil e na Europa. Nasci no Sul da Bahia, publiquei onze livros, colaborei como correspondente free-lancer na Europa para os jornais “A Tarde” (BA), “Folha de S. Paulo” e “O Tempo” (MG), entre outros, e revistas portuguesas e espanholas.


Nessas andanças, tive programa de tevê, colunas em jornais, diversos blogs; fui repórter de tevê, assessor de comunicação, agente cultural. A minha história, desde a infância em uma fazenda de cacau, passando pela saga jornalística e a publicação de livros, foi contada na cerimônia pelo mestre Diogenes da Cunha Lima, escritor e presidente da Academia Norte-rio-grandense de Letras, e Ana Cláudia Bezerra Barros, secretária adjunta municipal de Segurança Pública e Defesa Social.

“Pratico um ato de justiça, ao entregar o pergaminho da cidadania a um homem de imprensa. Além de valoroso escritor é um lutador, um desbravador que vive em função da arte, que acredita na força da mesma e semeia as sementes do trabalho honrado em todas as funções, tarefas e missões que exerce na vida profissional”, disse o vereador Heráclito Noé, concluindo: “Os nossos votos são de que continue firme na missão literária e jornalística, que adotou como lema de sua existência”.

diogenes da cunha lima discursando
O então vereador Heráclito Noé é professor universitário especializado em segurança pública, área na qual atua até hoje. Já exerceu cargos de diretoria na Academia de Policia do Rio Grande do Norte, Itep e Conselho Estadual de Entorpecentes. Preside o Rotary Clube de Ponta Negra e é um dirigentes do voluntariado da Fundação Bradesco e das Obras Salesianas. Estava na sua primeira e até o momento única legislatura.

Feliz com a homenagem, declarei na ocasião em entrevista: “Agradeço a generosidade de Heráclito Noé e a todos seus companheiros vereadores. Nunca, nem em meus desejos mais secretos, teria imaginado tal reconhecimento. O meu coração está sorrindo. Aprendi muito em Natal e me sinto em casa nesta cidade bela e acolhedora. Sem perder a ternura, pretendo continuar tentando entender o tempo em que vivo através da magia da escrita, investindo no toque autoral, passional e experimental. E Natal e sua gente – minha gente – reacendem a fé na crença artística que me leva efetivamente ao céu na terra”.

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Na TV CÂMERA


novembro 24, 2017

................ KAZUO ISHIGURO: “Um LIVRO INFLUENCIA muita GENTE”



As memórias, até mesmo as mais preciosas, desvanecem-se com uma rapidez surpreendente. Mas eu não quero deixar isso acontecer. Não quero ver as memórias que eu mais valorizo ​​desaparecerem.
KAZUO ISHIGURO

Ilustrações: THOMAS GIRTIN
(1775 - 1802. Southwark, Reino Unido)

ANTONIO NAHUD entrevistou o nipo-britânico NOBEL de LITERATURA 2017 em Barcelona, Espanha, 2001. Entrevista publicada no “Diário de Notícias” (Portugal), jornal “A Tarde” (BA) e no livro “ArtePalavra – Conversas no Velho Mundo” (2003).

Sua criação é excêntrica e arriscada. Considerado um dos autores vivos mais importantes, KAZUO ISHIGURO teve sua obra traduzida em mais de 28 países. Nascido no Japão, em Nagasaki, em 1954 – nove anos depois da explosão da bomba atômica -, reside desde os seis anos de idade na Inglaterra, onde se graduou em Inglês e Filosofia na Universidade de Kent, em Canterbury.

Obteve o consagrado Brooker Prize com seu terceiro romance, “Os Vestígios do Dia” (1989), que vendeu mais de um milhão de exemplares em língua inglesa e foi adaptado ao cinema por James Ivory, com Anthony Hopkins fazendo o protagonista, o mordomo Stevens. Irritado com a projeção excessiva gerada pelo filme, escreveu poucos depois “O Inconsolável” (1995), rompendo com seu estilo conhecido até então e recebendo em troca críticas negativas. A trama se passa em um país imaginário, onde um pianista famoso enfrenta incertezas econômicas, políticas e sociais.


Os dois primeiros livros do escritor, “Uma Pálida Visão dos Montes” (1982) e “Um Artista do Mundo Flutuante” (1986), foram campeões de vendas no Reino Unido, assim como todos os outros. Aos 48 anos, a fama parece não tê-lo afetado, passando sinceridade, tranquilidade e inteligência admirável. Em Barcelona, Espanha, para o lançamento de “Quando Éramos Órfãos” (2000), KAZUO ISHIGURO falou sobre literatura, britânicos e o sucesso.

O seu mais novo romance narra as aventuras de um detetive inglês, nascido em Shangai, angustiado com as recordações do desaparecimento dos seus pais, sequestrados há um quarto de século. Ele volta a sua cidade natal para localizá-los, encontrando um país invadido pelo Japão, às vésperas da Segunda Guerra Mundial. Como toda criação de KAZUO ISHIGURO, vai além de uma inquietante aventura literária.


O QUE PASSA NA MENTE DO SEU PROTAGONISTA?

O detetive da minha história, Christopher Banks, acredita que todos os problemas do mundo podem se resolver solucionando um único crime, o sequestro de seus pais quando ele era menino. Acha que o mal está ligado a esse fato e uma vez resolvido o mistério, o universo se harmonizará. Sabemos que a vida não é assim. Tampouco escrevi uma novela policial no estilo Agatha Christie.

PERCEBO QUE ESTE ROMANCE REAFIRMA O VALOR DA MEMÓRIA, OU SEJA, DO PASSADO. É UMA QUESTÃO FUNDAMENTAL PARA VOCÊ?

A memória é um dos meus temas preferidos. É um filtro muito interessante do nebuloso. Normalmente as pessoas negam o passado ou têm leituras muito particulares dele. É impressionante como se mente para si mesmo. Com os meus personagens procuro desvendar o conflito com o passado. Examinando recordações alheias percebemos o que querem esconder, o que os deixam mais orgulhosos, o que são e o que gostariam de ter sido. Penso que grande parte do que aconteceu na infância permanece em nossos corações para sempre. Escrevi este romance interessado no passado como algo que permanece dentro de nós e nos aprisiona.

CREIO QUE EXISTEM FATORES ALÉM DA NOSSA COMPREENSÃO QUE VETAM O PASSADO EM SUA TOTALIDADE.

Exato. Principalmente quando o passado foi sofrido, duro. Muita gente não consegue analisar completamente a sua própria história e outros ficam na dúvida se vale a pena ou não enfrentá-la, recordando apenas certos momentos. Eu acho que pouco importam os nossos fracassos, sempre há dignidade em encontrar força para enfrentar nossos próprios fantasmas. O detetive deste romance pensa assim.

COMPARADO A KAFKA EM SEU ROMANCE ANTERIOR, DISCORDOU DURAMENTE. NÃO GOSTA DO ESCRITOR CHECO?

Não é isso. Sou admirador de Kafka, parece-me interessante, mas não o entendo perfeitamente. Não vejo sua literatura com claridade. Sendo assim, como um romance meu pode ter estilo kafkaniano? Talvez tenha a ver com o espaço onde situo a narrativa, um mundo onírico. Acredito não ter os antecedentes nem a tradição de Kafka. Meus sentimentos não são kafkanianos. Nos primeiros trabalhos fui comparado a escritores japoneses por escrever sobre o Japão. A seguir a alguns ingleses por escrever sobre a sociedade inglesa. São comparações sem consistência.

ADMIRA ESPECIALMENTE ALGUM ESCRITOR?

Sinto-me emocionalmente muito próximo a Nabokov.

FICA FERIDO OU ACEITA SEM PROBLEMA CRÍTICAS NEGATIVAS?

Sem problema. Inclusive, prefiro que as críticas não sejam unânimes. Assim vejo meus erros. Sinto pena dos escritores acostumados a críticas generosas. Em consequência, são prisioneiros de elogios.

COMO SENTIU A ADAPTAÇÃO CINEMATOGRÁFICA DE “VESTÍGIOS DO DIA”?

Gostei, e muito. Quando pediram para filmá-lo, aconselhei que fizessem o melhor possível e conservassem o título original, mas tive dúvidas em relação ao resultado. Pensava que não se podia levar as telas o mundo interior dos meus personagens. Anthony Hopkins conseguiu. Já não sei o que dizer. O filme é bastante fiel ao romance. De inconveniente, a popularidade inesperada, mesmo passando a vender muito mais.

QUEIXA-SE DA POPULARIDADE ALCANÇADA E RELATOU O PESADELO DO SUCESSO EM “O INCONSOLÁVEL”. É DIFÍCIL PARA VOCÊ CONVIVER COM A FAMA?

Se gasta um tempo excessivo com a fama, um tempo que poderia ser utilizado escrevendo. São dezenas de entrevistas e viagens para promover a obra. Exatamente isto que estou fazendo ao conversar com você neste momento. Nos Estados Unidos é quase uma obsessão. Alguns escritores passam quatro meses fazendo este tipo de propaganda. Por exemplo, a escritora Amy Tan me disse que seu editor a enviou para uma série de viagens publicitárias durante seis meses. Ela passou a escrever aos pedaços, em seu minguado tempo livre. Uma loucura. Não quero fazer parte deste círculo vicioso. Mesmo com o grande sucesso de “Os Vestígios do Dia”, não me deixo levar pelos editores que insistem em uma nova obra a cada ano mais meses de dedicação publicitária. Pretendo continuar escrevendo com tranquilidade e profundidade, sem ganância ou superficialidade.

FAZ QUESTÃO DE INOVAR DE UM LIVRO PARA OUTRO?

As coisas mudam a medida que envelhecemos. Não quero ter a sensação de estar utilizando o que funcionou noutros livros, principalmente porque os anos passam, me levando a ser uma pessoa diferente que quer dizer algo diferente. Não pretendo me tornar um escritor folgado que utiliza as mesmas mágicas.

A LITERATURA INGLESA ATUAL TEM NOMES EXPRESSIVOS COMO MARTIN AMIS, HANIF KUREISHI, ENTRE OUTROS. O QUE PENSA DELA?

Sinto-me orgulhoso deste panorama de bons autores, mas garanto que nada temos em comum. Os ingleses pensam que a Inglaterra é o centro do universo literário. Até certo ponto concordo que já foi, mas hoje é diferente, muito diferente, e a principal influência intelectual da Inglaterra vem de escritores de fora, de Gunter Grass a Gabriel García Márquez.

FAZ PARTE DO GRUPO DE ESCRITORES QUE ACREDITA QUE O LIVRO VIVE SEU MOMENTO TERMINAL?

Nem pensar, muito pelo contrário. Existem livrarias em quase todos os lugares do mundo, ou seja, existem compradores de livros. Essa história de que as pessoas estão deixando de ler e só se interessam por vídeo ou internet não é verdade. O número de leitores de livros é imenso. Um livro influencia muita gente.


OBRA COMPLETA de ISHIGURO

UMA PÁLIDA VISÃO dos MONTES 
(A Pale View of Hills, 1982)

Seu primeiro romance conta a vida de uma sobrevivente da tragédia nuclear de Nagasaki. No exílio inglês, a velha Etsuko, viúva duas vezes, agora em companhia da única filha que lhe resta após o suicídio da outra, revê a terra natal no pós-guerra e medita sobre tudo o que significou a hecatombe para o ser solitário a que ela hoje se resume.

UMA CEIA em FAMÍLIA 
(A Family Supper, 1982)

Livro de contos.

UM ARTISTA do MUNDO FLUTUANTE 
(An Artist of the Floating World,1986)

A história de um homem e as mudanças que ocorrem em seu país, o Japão, depois da guerra. Masuji Ono, pintor famoso caído em desgraça, venera o passado guerreiro de sua nação e é rechaçado pelo caos e pela desintegração do presente - o “mundo flutuante” de bares e casas de gueixas. Com estilo elegante e preciso, o autor envolve o leitor nesse mundo com uma prosa límpida que capta com realismo e beleza as nuances da vida japonesa.

OS VESTÍGIOS do DIA 
(The Remains of the Day, 1989)

O narrador-protagonista reflete sobre o papel dos mordomos na história da Inglaterra. Depois de trabalhar durante anos na mansão de um lord, ele sai em viagem relembrando momentos da trajetória do ex-patrão, que simpatizava com o nazismo, e rememora suas próprias paixões.

O INCONSOLÁVEL 
(The Unconsoled, 1995)

Um pianista aparenta ter perdido parte da memória e considera o local onde realizará um concerto um tanto quanto surreal.

QUANDO ÉRAMOS ÓRFÃOS
 (When We were Orphans, 2000)

Usando um humor fino, narra a história de um detetive inglês nascido em Shangai à procura de respostas para o sumiço dos pais, que desapareceram quando ele tinha nove anos. Em uma China que vive uma guerra sangrenta com o Japão, ele acaba perseguindo também uma ordem para o mundo em que vive.

NÃO me ABANDONE JAMAIS 
(Never Let me Go, 2005)

Nesta ficção científica sutil e melancólica, garota relembra os anos em que viveu em um orfanato no qual todos os “alunos” eram clones, produzidos para servir como peças de reposição. Em 2010, a obra ganhou uma adaptação homônima para o cinema, que conta com Carey Mulligan e Andrew Garfield.

NOTURNOS - HISTÓRIAS de MÚSICA e ANOITECER 
(Nocturnes, 2009)

Nesta coleção de contos, o autor se rende a narrativas leves e bem humoradas sobre instrumentistas e amantes da música, de diversas partes do mundo. E traduz histórias tocantes como a do saxofonista que decide fazer uma plástica para ganhar mais reconhecimento.

O GIGANTE ENTERRADO 
(The Burried Giant, 2015)

Enveredando pela fantasia e se aproximando de autores como Tolkien, neste romance os personagens precisam lidar com as indefinições do amor e uma misteriosa névoa do esquecimento.

ROTEIROS

A MÚSICA MAIS TRISTE do MUNDO 
(The Saddest Music in the World, 2003)
direção de Guy Maddin

A CONDESSA BRANCA
 (The White Countess, 2005)
direção de James Ivory

O AUTOR


Vencedor do Nobel de Literatura 2017. Segundo a Academia Sueca, ele recebeu o prêmio porque “Em seus romances de grande força emocional, revelou o abismo sob nossa sensação ilusória de conexão com o mundo”.

A secretária-permanente da Academia Sueca, Sara Danius, afirmou: “Ele é um pouco como uma mistura de Marcel Proust, Jane Austen, comédia de costumes e Franz Kafka. Se você misturar isso um pouco, não muito, você tem a essência de Ishiguro”.