Ilustrações: CARAVAGGIO
(Caravaggio, Itália. 1571 - 1610)
Ele nasceu em Apodi, no interior do Rio
Grande do Norte, e mudou-se para a capital potiguar para estudar Direito.
Advogado, escreve artigos para jornais e colaborou com diversas antologias. Seu
primeiro livro, “Fátima e Pontmain – Aparições de Paz em Tempos de Guerra”, foi
publicado em 2015. Premiado com o segundo lugar no Concurso Literário Othoniel
Menezes de Poesia, lançou em 2019 “Cárceres: Vozes de Um Prisioneiro”,
celebrando a liberdade e, sobretudo, a fortaleza do espírito humano.
01
Quem é Renan II de Pinheiro e Pereira?
Um cara que gosta de ler e ouvir boa
música, dá muito valor aos amigos, tenta fazer a coisa certa na maioria das
vezes e de certa forma é um paradoxo que nem ele consegue explicar.
02
Como se deu seu contato inicial com a
literatura?
Minha mãe foi professora e sempre soube a
necessidade de estimular as crianças a ler desde cedo. Por isso, quando eu já
tinha condições de olhar alguma coisa ela me dava revistas em quadrinhos e
jogos de letrinhas, e depois de rasgar muita coisa comecei a prestar atenção e
brincar de compor palavras. O resultado é que aprendi a ler aos três anos, fui
para a escola (na Pré-Escola, aos 5 anos, fui escolhido para orador porque era
o único que realmente sabia ler), e das revistinhas passei para os livros
infantis, daqueles livros grandes ilustrados de histórias da Disney vendidos
pelo Círculo do Livro, quando tinha entre 4 e 5 anos. Na infância me dividi
entre os gibis e os livrinhos ilustrados, geralmente historinhas da Bíblia para
crianças ou contos de fadas (alguns acompanhados de fitas cassete), e
seguramente meus primeiros livros mais volumosos foram três volumes de contos
de fadas, chamados de “Fantasia Colorida da Criança”, com contos clássicos e
outros menos conhecidos. Em seguida, fui
passando para livros com um pouco mais de volume (talvez os primeiros que li
nesse estilo tenham sido “O Pequeno Príncipe”, “Pollyanna” e “Pollyanna Moça”),
e com certeza o primeiro livro que li sem ter um fundo infanto-juvenil foi a
Bíblia, que ganhei aos nove anos e li nessa mesma idade, ainda que tenha ficado
sem entender muita coisa. Desde criança que gosto de escrever (ainda conservo
dois diários que escrevi nesse tempo), eu tinha o costume de às vezes brincar
de fazer historinhas com desenhos em folhas de caderno e grampeá-las como se
fossem livros.
03
Escrever o ajuda a viver melhor?
Sem dúvida. É a melhor maneira que
encontro para expressar meus desejos e minhas emoções, muitas vezes
simplesmente me veio do nada a vontade de escrever e tive de deixar de lado o
que fazia para registrá-lo, sabia que se eu deixasse para depois não seria a
mesma coisa.
04
O fato de morar afastado do eixo Rio-São
Paulo limita a divulgação de sua literatura?
Infelizmente sim, e tive uma mostra disso
quando publiquei meu primeiro livro, “Fátima e Pontmain – Aparições de Paz em Tempos de Guerra”. Como ele foi publicado por uma editora de circulação
nacional (a Editora Ecclesiae, com sede em Campinas), foi recomendado pelo
jornal da Arquidiocese de São Paulo e cheguei a ser convidado para proferir uma
pequena palestra na parte luso-brasileira de um congresso em Fátima. Não dá
para negar que, a menos que você tenha amigos ou conhecidos nesse eixo, fica
difícil você ser notado no território nacional, pois a maioria das editoras e
dos grandes eventos são concentrados lá.
05
O que acha de teorias literárias? Elas de
alguma forma lhe influenciam?
Acho importante conhecer as teorias
literárias, para entender como se deu a evolução da Literatura, mas acho que
nenhum autor deve deixar-se prender a elas. O que faço é tentar buscar minha
identidade autoral, e nesse processo posso incorporar aspectos de uma ou outra.
06
Como você define a sua poesia?
É uma poesia que tem muito de romântica,
mas é principalmente reflexiva, tentando registrar meus sentimentos em relação
a mim e ao mundo.
07
Caso fosse lhe vedado a escrita, o que
faria?
Com certeza eu sofreria muito, e depois
tentaria registrar meu mundo interior de outra maneira. Só sei que, para estar
bem, preciso me expressar.
08
Pouco chega ao resto do Brasil a poesia e
prosa do Rio Grande do Norte. O meio literário é injusto e excludente ou faltam
bons escritores potiguares?
Não creio que a terra que gerou Cascudo e
Othoniel Menezes tenha deficiência de bons escritores, tanto que nos últimos
anos tivemos autores potiguares participando de eventos literários em Havana e
mesmo na França. Sendo assim, o que falta mesmo é interesse das editoras em promover
talentos oriundos das regiões mais distantes das metrópoles.
09
Como os escritores do Nordeste do Brasil
têm reagido em relação aos problemas do Brasil?
O Nordeste tem uma tradição antiga de
questionar a opressão e a miséria, e no RN não tem sido diferente. A editora
CJA Edições tem se destacado publicando livros nessa linha, e um deles foi
“Exortações de um Maldito”, do meu amigo Brunno Mariano Campos, romance
ambientado durante as passeatas de 2013.
10
Escrever é uma vaidade ou uma necessidade
em um mundo com tanta injustiça e miséria?
Mesmo que o autor seja vaidoso, a escrita
em si é uma necessidade do mundo, seja para registrar seja para denunciar e
combater a injustiça e a miséria. E às vezes até para aliviá-las, muitos torcem
o nariz para a literatura de entretenimento mas até quem gosta de temas
profundos precisa rir e sonhar em alguns momentos.
11
Por que o encarceramento existencial como
tema do seu primeiro livro de poesia?
Como você observou, o Cárcere de que
trata o livro não é só a prisão física. A ideia de escrevê-lo me ocorreu como
uma maneira de registrar as dores de quem tem a vida restrita por alguma razão
e, principalmente, de fazer com que os outros enxerguem que quem está numa
situação dessas precisa sentir-se apoiado e amado, pois muitos até vêem a vida
difícil que essa pessoa leva, mas se isso não aparece em seu rosto elas acham
que está tudo bem e não se detém para conversar com ela, escutá-la e oferecer
ajuda, mesmo que essa ajuda seja apenas um abraço.
12
Como surgiu a ideia de um canal no
Youtube e como ele se apresenta?
O nome do meu canal é “Cantinho do
Renan”, e começou quase por acaso. Há anos que tenho o costume de, na época do
Natal, escrever uma mensagem comemorativa e enviá-la por e-mail e, depois,
também pelas redes sociais. Acontece que, na véspera de Natal de 2016, quis
fazer um pouco diferente e gravei um vídeo em que cantava à capela minha canção
de Natal favorita, “Have Yourself a Merry Little Christmas”, publicando-o no
Facebook como minha mensagem de Boas Festas. Esse vídeo teve uma repercussão
tão positiva em visualizações e curtidas que decidi fazer um vídeo por dia,
sempre com uma canção natalina diferente, até o dia 06 de janeiro. Diante da
acolhida significativa que eles tiveram, no mesmo ano de 2017 fiz mais duas
séries de vídeos, uma no mês de junho, com 30 canções românticas em português e
quatro idiomas estrangeiros para comemorar o dia dos namorados (pois eu percebi
que o comércio estava quase substituindo o nosso dia 12 pela data do Valentine’s
day), e outra em outubro, em que gravei 31 canções marianas para comemorar o
fim do ano mariano instituído pelo Papa Francisco. Recebi muitos cumprimentos
pela iniciativa e começaram a sugerir que eu criasse um canal no Youtube para
publicar esses vídeos, o que me levou a refletir durante alguns meses, até que
criei o canal em fevereiro do ano passado. O estilo dos vídeos é semelhante aos
que publiquei no Facebook, em que eu inicio contextualizando a música,
explicando seu sentido e acrescentando uma ou outra informação interessante
ligada a ela, e depois eu a interpreto, à capela ou, se eu encontrar algum
playback interessante, com esse acompanhamento, já que não toco instrumentos
musicais. Filmo os vídeos com meu celular na minha biblioteca, e tento
transmitir nesse canal a importância da cultura e da boa música, às vezes me
arriscando também a comentar algum livro.
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Foi importante o segundo lugar no
Concurso Literário Othoniel Menezes de poesia? Você valoriza concursos
literários?
Foi extremamente importante, até porque
foi o valor do prêmio que me permitiu publicar o livro. Sou totalmente a favor
dos concursos literários, já que o mercado brasileiro de poesia é muito difícil
e eles ajudam a divulgar novos nomes, já que as editoras em geral só bancam a
edição de poetas consagrados.
14
Traduza “Cárcere: Vozes de Um
Prisioneiro”?
É uma obra poética conceitual, já que ela
gira em torno da experiência do personagem encarcerado, seja de forma objetiva
(quando ele descreve os demais personagens e até os objetos com que convive) ou
de forma subjetiva (quando ele se permite mergulhar nos seus desgostos, receios
e decepções com aquela nova situação). Mas também é uma obra de esperança, pois
ele sabe que não sobreviverá se ceder à amargura.
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Precisa ser reconhecido ou isso não é
importante?
Nenhum escritor que se preze abre mão do
reconhecimento de livre e espontânea vontade. Se eu me dedico a um trabalho,
como não vou gostar de saber que ele repercutiu?
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Quais os escritores e poetas nordestinos
que tocam a sua sensibilidade?
Na poesia sou bem tradicional, tanto que
minhas referências foram Augusto dos Anjos e depois Patativa do Assaré. Na
prosa, fico com Jorge Amado e Gilberto Freyre, que conseguiu escrever
sociologia de uma forma bem gostosa de ler.
17
Em quais projetos literários está
trabalhando e o que podemos esperar já para 2019?
Tenho 4 livros de poesia não-publicados,
além de um livro de prosa, todos concluídos, além de projetos em aberto. Neste
momento, o que eu mais gostaria é de encontrar uma forma de publicar essas
obras, pois todo pai deseja tornar seus filhos conhecidos.
CLIP
Uma frase literária:
“Se eu falo as línguas dos homens e dos
anjos, mas não tenho amor, sou como o bronze que soa ou o címbalo que retine.”
– 1 Coríntios 13,1.
Uma cena de romance:
A cena final de “Um Conto de Duas Cidades”, de Charles Dickens.
Um verso:
“Pera tão longo amor tão curta a vida”,
de Camões.
Uma palavra:
Esperança.
Um título de livro:
“Mulherzinhas”, de Louisa May Alcott.
Um texto teatral:
“Otelo”.
Um personagem:
Cyrano de Bergerac, de Edmond de Rostand.
Um filme:
“... E o Vento Levou”.
Música:
“Smile”, de Charles Chaplin.
TV:
O “Vídeo Show” dos anos 80 até o início da
década passada.
Uma atriz:
Bibi Ferreira.
Um ator:
James Stewart.
Um diretor de cinema:
Frank Capra.
Blogue:
Adendos e Sentimentos
Um país:
Brasil.
Ídolo:
Tom Jobim.
Um momento feliz:
Quando segurei meu primeiro livro
publicado.
Medo:
Do esquecimento.
Um assunto proibido:
Mediocridades.
01
EXERCÍCIO de EMPATIA
Àquele que me contempla com pena
Ou pensa que, se passo o que passo,
Não é nada além do que eu mereço,
Concluindo seu exame com condescendência,
Antes de voltar à sua vida perfeita e
ordenada:
Só pediria que ao menos me permitisse
Contar um pouco das minhas experiências,
Imaginasse como se sairia
Caso essa vida fosse alterada
Pouco a pouco ou num instante,
E depois, conhecendo a si mesmo,
Respondesse se faria igual ou diferente.
02
LUZ e ESCURIDÃO
Quando se vive na incerteza
De um destino que lhe é imposto,
Necessita-se em proporções quase iguais
Da luz e da escuridão.
A primeira ilumina o ambiente,
Possibilitando que se perceba o que há
E o que ocorre ao seu redor,
Além de revelar o que é belo e útil.
A segunda vem com a noite,
Trazendo o descanso e o sono,
Marcando também a passagem
De um dia para o outro.
Uma iluminando a realidade
E a outra abreviando a duração
Do período em que é suportada,
E por isso ambas são importantes.
03
RENOVAÇÃO
Muitas vezes o melhor consolo
Quando o que você diz não encontra eco
Nos ouvidos alheios,
É perseguido sem razões,
Com protestos de inocência sendo
Ignorados sem serem avaliados,
Aqueles que pareciam lhe querer bem
Dão a impressão de estarem
Demasiadamente envolvidos com suas vidas
Para lhe estenderem a mao
E a ausência de boas notícias
Ameaça roubar sua vontade de comer,
É a percepção de que nada é eterno
Neste mundo, e cada novo dia
Contém um futuro não-escrito
Onde tudo pode ser diferente.
Do livro “Cárcere: Vozes de Um Prisioneiro”
(2019)
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