novembro 12, 2011

............................................ O CASTELO de RILKE

fotografia de rudolph koppitz
Majestosa edificação de grande estatura, cujas dimensões, estética e imponência despertam admiração, à beira do mar Adriático, quase inacessível, o Castelo de Duíno sobrevive ao esquecimento. O príncipe italiano Carlo Alessandro e o seu mordomo argentino José Gustavo são os mais recentes moradores desse monumento artístico e cultural imortalizado nos versos de Rainer Maria Rilke (1875 - 1926), que viveu nele de 1910 a 1912, então propriedade de sua amiga e mecenas, a princesa Marie von Thurn und Táxis.

Deslumbrado com “As Elegias de Duíno” (1912-1923), obra em que o poeta austríaco revela a influência do pensamento filosófico de Sören Kierkegaard, visitei o castelo-personagem nos primeiros anos deste novo milênio. Fabuloso, mesmo sem o açoite de ondas em fúria ou fantasmas de contos góticos. Ao seu lado, as ruínas de outro castelo, tal e qual eu guardava na imaginação. Portanto, há dois castelos em Duíno. Do mais velho se comenta dos cultos lunares ritualizados pelos druídas, fala-se também que teve como hóspede no século 14 o autor de “A Divina Comédia” (1304-1321), Dante Alighieri, considerado o primeiro e maior poeta da língua italiana, definido como “Il sommo poeta” (O poeta supremo).

Situado a uns vinte quilômetros da cidade italiana de Trieste, o Castelo de Duíno tem abriga um museu que conserva a memória dos tempos de glória. De uma antiga torre, notei o caminho que leva da fortaleza a praia de Sistiana, trajeto que percorrido diariamente por Rainer Maria Rilke durante sua longa estadia. Poeta hermético cujos poemas traduzem a angústia de um ser inadaptado, Rilke acumulava às suas circunstâncias vitais o fato de ser homossexual em uma sociedade repressiva. Em Duíno escreveu também os poemas que compõem a obra “A Vida de Maria” (1913), os quais o compositor alemão Paul Hindemith viria a musicar. Trabalhando com os limites sensoriais da existência e da melancolia, a sua poesia traduz o fundamento da busca de ser. 

Para Rilke, a poesia não podia ser senão mística, no sentido em que a existência humana só poderia encontrar a sua salvação através da linguagem poética, aspirando ao plano da totalidade, ou seja, a de uma dizibilidade absoluta e redentora. As Elegias apresentam a morte como uma transformação da vida em uma realidade interior, gerando um todo unificado, uma experiência cósmica. Ainda hoje me lembro do impacto da primeira leitura desses versos: “Pois o belo apenas é o começo do terrível, que só a custo podemos suportar, e se tanto o admiramos é porque ele, impassível, desdenha destruir-nos. Todo o anjo é terrível”.

manuscrito de "elegias de duíno"
Propriedade de família nobre, muito antiga, de origem Bergamasco, os Torre e Tasso, o Castelo de Duíno se aproxima dos mil anos de existência, destacando-se durante séculos com uma intensa  alegoria social, artística e cultural ao receber Marcel Proust, Valéry, Einstein, a atriz Eleonora Duse e outras gigantes das artes. Durante a Primeira Guerra Mundial, bombardeado e arruinado, posteriormente renasceu das cinzas. 

Atualmente, além de receber literárias peregrinações, é também um negócio turístico-empresarial alugado para seminários ou celebrações de casamentos. Os visitantes se encantam com “Rocca Degli Usignoli”, um superficial espetáculo de luzes e sons. Seguramente não é um castelo de contos-de-fadas, mas se tornou imortal por sua história, pelos versos de Rilke e pela visão privilegiada do Adriático.

castelo de duíno

11 comentários:

Irene Serra disse...

Antonio, querido

Acertou, mais uma vez. Dá até vontade de conhecer o Castelo, ver as ruínas do antigo, sentir o cheiro do mar percebendo você, também, ali.

Já lhe disse que você é meu escritor preferido e mora no meu coração? Se disse, repito, se não disse, tá dito.

Beijos,
com muito carinho,
Irene

SONIA BIERBARD disse...

Pois arte é infância. Arte significa nao saber que o mundo já é, e fazer um. Não destruir nada que se encontra, mas simplesmente nao achar nada pronto. Nada mais que possibilidades. Nada mais que desejos. E, de repente, ser realização, ser verão, ter sol. Sem que se fale disso, involuntáriamente. Nunca ter terminado. Nunca ter o sétimo dia. Nunca ver que tudo é bom. Insatisfação é juventude.


Rainer Maria Rilke, in Cartas do poeta sobre a vida

ENÉAS ATHANÁZIO disse...

Meus parabéns! Estão excelentes, tanto o texto como a foto.
Abraço do
ENÉAS ATHANÁZIO

Camilo disse...

Parabéns.

E. SANCHES disse...

Bravo amigo
Vamo Q Vamo

A Arte de Inha Bastos disse...

Muito bom Antonio,parabéns!

Telma Monteiro disse...

Amo Rainer Maria Rilke...

Stela B. de Almeida disse...

Parabéns. Retornei ao castelo de Rainer Maria Rilke.

Poeta Silvério Duque disse...

Caro Antônio,

"As Elegia s de Duíno", de Rilke, constituem não só uma das mais importantes obras da literatura alemã da primeira metade do século XX, como também uma das poéticas mais significativas do nosso tempo...

Eu simplesmente as adoro.

Poucos textos me marcaram tanto; foram-me tão perturbadores com sua visão poética e trágica de um mundo que desaparece e nos assombra...

Parabéns pelo novo espaço,

Abraços,


Silvério Duque

João Roque disse...

Parabéns por este novo blog.
Rilke é um escritor que sempre me seduziu.

GIDEON ROSA disse...

Antônio Júnior,
meu filho amado, lindo, lindo, lindo, muito consistente, uma delícia, estou repassando para minha lista. Esse artigo sobre O Castelo de Rilke é delicioso. beijo no coração. gideon